A diferença entre um conto e um romance não é apenas o fato de que um é pequeno e o outro é grande. Diferença de escala determina também uma diferença de estrutura. Comparemos com a pintura. Um quadro com as dimensões aproximadas da Mona Lisa é feito para ser visto de uma certa distância, revelar certo nível de detalhe, produzir uma impressão específica. Quadros enormes como o Grito do Ipiranga de Pedro Américo ou as Bodas de Caná de Veronese pedem outro tipo de leitura. Contemplar “palmo em cima” um quadro como esses, ou como a Ronda Noturna de Rembrandt, equivale a ver uma sucessão de Monas Lisas justapostas como ladrilhos num mosaico, e precisamos de um recuo muito maior para ter a percepção do Todo.
O tamanho relativo de um quadro muda nossa relação espacial com ele, e no caso da obra escrita essa variação muda nossa relação com o Tempo. Histórias curtas sempre existiram, oriundas da literatura oral e das chamadas formas simples (a fábula, a lenda, etc.) – ou, numa classificação mais nossa, a anedota, a piada, o “causo” pitoresco. Estas formas, contudo, ao serem incorporadas à literatura escrita sofreram a inevitável interferência do temperamento pessoal de autores com mais recursos, que foram lhes dando outro perfil.
Edgar Allan Poe deve ter sido o primeiro (ou pelo menos o primeiro mais famoso) a formular uma regra essencial do conto moderno. Poe sugeriu que o conto deveria requerer, para sua leitura, “de meia-hora a uma ou duas horas”, e completou: “Durante a hora da leitura, a alma do leitor permanece submissa à vontade (do autor)”. Os melhores analistas da obra de Poe reconhecem aí uma das razões do impacto de seus contos, que estão completando mais de 150 anos de idade.
É o caso de Baudelaire, que ao comparar o conto e o romance destaca, no primeiro, a “unidade na impressão, na totalidade do efeito”. Baudelaire foi um dos primeiros a perceber a importância, nos contos de Poe, de uma escrita em que tudo conduz para um desfecho. A impressão que um conto desse tipo nos provoca deve ser una, inteira, contínua. O conto deve poder ser lido de uma assentada, sem interrupções, para que nada venha quebrar o encantamento com que o texto, frase por frase, obriga o leitor a ler a frase seguinte. Um conto é como um salto de trampolim numa piscina: um movimento rápido, intenso, indivisível, algo que transcorre no tempo mas cuja tensão interna nos produz a impressão de algo inteiro, algo já completo onde nada falta e nada sobra.
Já o romance não busca a intensidade, mas a extensão da experiência ao longo do tempo. Um romance é para a gente conviver, para nos fazer companhia durante dias. Ele não depende da impressão forte e momentânea, e sim do acúmulo de mil pequenas coisas que se sucedem e criam uma história que parece que não vai ter fim. (Talvez por isso as histórias de amor queiram se chamar “romances”.) Um conto é um salto de trampolim na piscina; um romance é uma travessia a nado.
O tamanho relativo de um quadro muda nossa relação espacial com ele, e no caso da obra escrita essa variação muda nossa relação com o Tempo. Histórias curtas sempre existiram, oriundas da literatura oral e das chamadas formas simples (a fábula, a lenda, etc.) – ou, numa classificação mais nossa, a anedota, a piada, o “causo” pitoresco. Estas formas, contudo, ao serem incorporadas à literatura escrita sofreram a inevitável interferência do temperamento pessoal de autores com mais recursos, que foram lhes dando outro perfil.
Edgar Allan Poe deve ter sido o primeiro (ou pelo menos o primeiro mais famoso) a formular uma regra essencial do conto moderno. Poe sugeriu que o conto deveria requerer, para sua leitura, “de meia-hora a uma ou duas horas”, e completou: “Durante a hora da leitura, a alma do leitor permanece submissa à vontade (do autor)”. Os melhores analistas da obra de Poe reconhecem aí uma das razões do impacto de seus contos, que estão completando mais de 150 anos de idade.
É o caso de Baudelaire, que ao comparar o conto e o romance destaca, no primeiro, a “unidade na impressão, na totalidade do efeito”. Baudelaire foi um dos primeiros a perceber a importância, nos contos de Poe, de uma escrita em que tudo conduz para um desfecho. A impressão que um conto desse tipo nos provoca deve ser una, inteira, contínua. O conto deve poder ser lido de uma assentada, sem interrupções, para que nada venha quebrar o encantamento com que o texto, frase por frase, obriga o leitor a ler a frase seguinte. Um conto é como um salto de trampolim numa piscina: um movimento rápido, intenso, indivisível, algo que transcorre no tempo mas cuja tensão interna nos produz a impressão de algo inteiro, algo já completo onde nada falta e nada sobra.
Já o romance não busca a intensidade, mas a extensão da experiência ao longo do tempo. Um romance é para a gente conviver, para nos fazer companhia durante dias. Ele não depende da impressão forte e momentânea, e sim do acúmulo de mil pequenas coisas que se sucedem e criam uma história que parece que não vai ter fim. (Talvez por isso as histórias de amor queiram se chamar “romances”.) Um conto é um salto de trampolim na piscina; um romance é uma travessia a nado.
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