Quem acompanha a série de filmes O Senhor dos Anéis deve lembrar-se das suas memoráveis cenas de batalha, especialmente no segundo e no terceiro filmes. O que parecem ser dezenas de milhares de extras fantasiados de orcs é na verdade uma criação de computador. Com exceção dos atores e figurantes que combatem de verdade diante das câmaras, todo aquele tapete de guerreiros armados até os dentes, que parece se estender até o horizonte, é gerado por computação gráfica. Para maior realismo, os programas fazem cada um desses “figurantes gráficos” se comportar de maneira ligeiramente diversa dos demais, para que tudo não fique parecendo um balé ensaiado ou uma coreografia de loops repetitivos.
Acontece que os programas vão se sofisticando. Há videogames onde é possível determinar no computador o que cada soldado daqueles vai fazer. Ele está sendo “pilotado” por um programa capaz de observar o cenário, deslocar-se no terreno, registrar e avaliar os movimentos dos outros figurantes, trocar golpes com o inimigo. Um técnico envolvido nesse processo queixou-se certa vez de que o grande problema era que os “figurantes virtuais” muitas vezes batiam em retirada, fugiam do campo de batalha. Quando o programa percebia que matematicamente suas chances eram poucas, eles passavam sebo nas canelas, corriam com a sela, davam às de vila-diogo. O técnico se queixava: “Não podíamos tornar os computadores burros o bastante para serem obrigados a lutar.”
Rapaz, isso na mão de um filósofo pode ficar muito engraçado. Veja o Oriente Médio. Conseguimos obrigar seres humanos jovens, instruídos, racionais, a vestir uma farda para ir matar gente num cu-do-judas qualquer. Ao mesmo tempo, uma mera simulação de computador consegue mandar a batalha às favas e cair fora. E ainda falam em que não há determinismo, e que o ser humano tem livre arbítrio. A julgar por esse pessoal que vai pra guerra, o livre arbítrio do ser humano é equivalente ao de uma baleia amestrada, como a Free Willy.
A liberdade é menor na vida real, mas vai se tornando mais alcançável no mundo dos jogos cibernéticos. Os superespetáculos, daqui a (quantos?) anos, serão uma mistura do cinema tela-grande com som Dolby estéreo, que temos hoje, com os jogos online como Última ou Counter Strike. Assim como neles, os espetáculos futuros juntarão milhares de personagens, que povoarão uma cidade ou entrarão em combate: e cada um deles é “pilotado” por um cara diante de um computador (ou com um PC no pulso) em qualquer parte do mundo. Filmes prontos, “obras fechadas”, virarão uma raridade cult. O público vai querer interatividade e competitividade. Irá se ampliando o espaço para os filmes improvisados por milhares de players. Em seus episódios mais dramáticos, eles serão transmitidos pela TV, ou reproduzidos em salões com imensas telas digitais diante de uma platéia onde se misturam jogadores e meros espectadores. Seremos Frodo, alguém será Sauron.
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