O que é uma fórmula? É um conjunto de elementos que se
devidamente usados produzem um resultado específico.
A fórmula da água, H20, nos indica que se juntarmos dois
átomos de hidrogênio e um de oxigênio teremos uma molécula de água, e que essas
moléculas, em quantidade suficiente, formarão o liquido que conhecemos tão bem.
A fórmula do romance detetivesco indica que deve haver um
crime, que de início deverá haver um mistério acerca do crime (quem o cometeu,
por quê o cometeu, como o cometeu), e que caberá a um personagem, o detetive,
examinar os fatos e achar a solução.
Existem outras fórmulas literárias mais sofisticadas.
Por exemplo, os manuais de literatura falam da “sátira
menipéia” (as denominações variam), cujas características principais seriam:
1) ausência de
enobrecimento dos personagens;
2) mistura do sério e do cômico;
3) desprezo à verossimilhança, admitindo "as fantasmagorias mais desvairadas";
4) a representação frequente de "estados psíquicos aberrantes";
5) o uso intercalado de outros gêneros (cartas, novelas encapsuladas) no interior da história propriamente dita.
Capturei esta fórmula de um texto de José Guilherme Merquior sobre Machado de Assis e o seu Brás Cubas, onde Merquior aponta as semelhanças entre o livro de Machado e os traços desse gênero.
Um gênero literário não é mais do que um conjunto de
obras que podem ser classificadas de acordo com uma fórmula. Os elementos
citados na fórmula estão no livro? Então pronto.
Claro que sempre é preciso fazer um certo
aconchambramento para que cada livro se encaixe bem direitinho na fórmula.
Arranjar exemplos para uma teoria é sempre um “leito de Procusto”, aquele cara
da mitologia grega que tinha um leito onde ele amarrava os prisioneiros: se o
preso era muito comprido e sobravam os pés, ele cortava; se era baixinho e os
pés não igualavam com o leito, ele o esticava com roldanas.
Os teóricos da expressão artística fazem isso há séculos,
para demonstrar que o livro A é ficção científica, que o filme B tem ideologia
popular, que o quadro C pertence à escola cubista, que a música D é rock
autêntico...
Fórmula e obra são duas coisas diferentes. Alguém já disse
que “o escritor medíocre obedece à fórmula, o escritor de talento desobedece à
fórmula, e o gênio explode a fórmula e impõe uma fórmula nova”. Tipo isso.
(W. J. Solha)
2) mistura do sério e do cômico;
3) desprezo à verossimilhança, admitindo "as fantasmagorias mais desvairadas";
4) a representação frequente de "estados psíquicos aberrantes";
5) o uso intercalado de outros gêneros (cartas, novelas encapsuladas) no interior da história propriamente dita.
Capturei esta fórmula de um texto de José Guilherme Merquior sobre Machado de Assis e o seu Brás Cubas, onde Merquior aponta as semelhanças entre o livro de Machado e os traços desse gênero.
Eu estava vendo nas redes sociais uma postagem de W. J.
Solha, o escritor e artista plástico paulista "renascido" como paraibano. Solha
dizia de sua estranheza ao ter um dos seus livros classificados como um
“épico”, e outro se inscrevia na “literatura carnavalizadora” de Bakhtin. E
Solha comenta, com bom humor: “Eu nunca tinha ouvido falar no russo nem nessa
sua teoria”.
Existem dois tipos de criação artística. O primeiro deles é o que se pratica por aí em geral: absorver as obras alheias, e criar obras pessoais. O segundo é: absorver os preceitos teóricos e as fórmulas produzidas pelos teóricos, e criar a partir delas. Nenhum é melhor ou mais legítimo do que o outro – dependendo do resultado.
2 comentários:
Quando a gente escreve, só escreve. Depois é que toma tento e percebe que escreveu. É meio que um vício, mas acho que dá certo, que tá tudo bem. Escrevemos, não escrevemos? Então tá bem e se não se não estiver decretamos que está. A fórmula só vai aparecer no ensaio, na dissertação, mas aí já são outros demônios...
O homem parece carente de uma estrutura que o explique algo, que humanize o que lhe é desconhecido, como certa vez escreveu Drummond. Excelente artigo. Parabéns.
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