Uma frase muito citada por aí, e atribuída a Shakespeare, é a que define o teatro como “quatro tábuas e uma paixão”. Ou seja, para se fazer teatro precisa-se apenas de um espaço mínimo, para encenar em cima dele uma paixão humana representada por atores. É uma frase que equivale à famosa máxima de Glauber Rocha para fazer cinema, “uma câmara na mão e uma idéia na cabeça”.
Fui rastrear essa frase e, como sempre, descobri que a
história é muito diferente. Pra começar, não é de Shakespeare; tudo indica que seja
de Alexandre Dumas. Num artigo
publicado em 1883 a respeito de Dumas, William Ernest Henley cita o autor
francês:
“’Tudo que eu quero,’ disse Dumas numa comparação memorável
entre ele próprio e Victor Hugo, “são quatro cavaletes, quatro tábuas, dois
atores e uma paixão’; e as suas peças são uma prova de que não falava mais que
a verdade”.
Quatro cavaletes, com quatro tábuas deitadas por cima deles,
fornecem um palco mínimo. Já vi alguns atores e músicos (não são todos, claro)
dizerem que pra se apresentarem bem precisam estar acima do chão, nem que seja
um palmo. Não por se acharem superiores, mas para terem melhor a sensação de um
espaço diferenciado, o espaço da criação, que (na cabeça deles) precisa ser
distinto do espaço da platéia. Veja-se
que Dumas lembra de incluir os “dois atores”, porque o ator é o núcleo do
teatro, sem eles nenhuma “paixão” é possível.
O número de tábuas varia entre duas, três e quatro, nas
outras referências que achei no Google.
Acabei achando até referências minhas, no tempo em que eu, indo de
maria-vai-com-as-outras, atribuí a frase a Shakespeare. Pelo que vi agora, acho que foi mesmo Dumas
quem disse primeiro.
Quatro tábuas, dois atores, uma paixão. Esta seria para mim a fórmula mais redonda
para essa idéia, inclusive pela simetria geométrica que propõe, numa
concentração de importância proporcional à diminuição de quantidade (4, 2, 1).
Um comentário:
Lembro aquele conto de Asimov no qual ninguém mais sabe fazer contas. Quando os computadores entenderem completamente os comandos de voz, a humanidade vai desaprender a escrever e esquecer mesmo qualquer regra de ortografia.
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