sexta-feira, 24 de dezembro de 2010

2434) O código de Kryptos (23.12.2010)



Já comentei aqui na coluna (“O mistério de Kryptos”, 24.6.2005 - http://tinyurl.com/2924br6) o criptograma esculpido nos jardins do quartel-general da CIA, na Virginia. A Agência encomendou uma obra de arte que “produzisse sentimentos de bem-estar e esperança”, e o vencedor da concorrência foi David Sanborn. A obra contém quatro painéis com textos em código, e desde sua criação, há dez anos, o criptograma virou uma mania entre alguns milhares de malucos no país. Três painéis já foram decifrados e o último, um bloco de 97 caracteres, continua mais impávido do que a Esfinge do Egito.

Um artigo no New York Times (http://tinyurl.com/2bdmx58) comenta este fato, e entrevista Sanborn, o qual começou a dar pequenas dicas para facilitar o esforço de decifração. Ele indicou, por exemplo, que as letras de 64 a 69, que são NYPVTT, significam respectivamente BERLIN. Nada mau para arregaçar as mangas e começar um trabalho! Os três outros textos já decifrados são, respectivamente: 1) um texto dizendo “Entre as sombras sutis e a ausência de luz jazem as nuances da iqlusão” (com este erro de digitação, proposital, para confundir os decifradores; 2) uma brincadeira com a localização geográfica do prédio, dando latitude e longitude; e finalmente 3) um longo trecho do egiptólogo Howard Carter em que ele narra o momento em que abriu a tumba de Tutankhamon.

Os criptogramas têm uma aparência aleatória, mas sabemos com certeza que por trás deles há algo que faz sentido. O primeiro aspecto ecoa nossa perplexidade diante da aleatoriedade do mundo real (desde que estejamos dispostos a vê-lo como ele é). Tudo que existe na Natureza está aqui sem intenção da parte de alguém. O segundo aspecto nos garante a recompensa final de que “isto faz sentido”, e, se não a descoberta desse sentido, pelo menos a convicção de que ele existe.

Nada nos assusta tanto quanto o Acaso em seu estado bruto. Nada nos reconforta tanto quanto a certeza de haver uma resposta. Se alguém me mostra uma sucessão aleatória de letras (JDUEYEEOFUNNDKPAOIGFR) é como se me mostrasse uma foto de Júpiter ou do fundo do mar, ou seja, um lugar que está vedado para mim por toda a eternidade. Mas basta alguém me cochichar: “É uma mensagem cifrada...” e esse pequeno caos se transforma magicamente em algo a um passo de distância. Eu posso. Está ao meu alcance. É só ter as ideias certas e fazer o esforço necessário.

Os cientistas agnósticos se maravilham quando descobrem as regularidades espantosas da Natureza. Na Filosofia da Ciência existe um enorme departamento destinado a mostrar de que maneira a Ordem pode brotar do Caos. Organismos altamente sofisticados podem se desenvolver sem a intervenção de uma Inteligência Superior, apenas com um processo de feedback que incrementa as variações bem sucedidas. É como se jogássemos um bilhão de letras para o alto e ao cair elas formassem sonetos de Camões, romances de Alexandre Dumas, a resposta do Código de Kryptos.

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