A última vez que a Avenida Presidente Vargas e a igreja da
Candelária ficaram daquele jeito foi no famoso comício das “Diretas Já”, que
dizem que deu um milhão de pessoas. Não importa quantas foram. Nunca se vira
tamanha quantidade. Mas no comício sobre a Emenda Dante de Oliveira havia um
esforço concentrado e consciente vindo de cima, vindo das elites políticas, dos
caciques partidários, dos notáveis com cacife para opinião política. Havia um
sistema de som, um planejamento de mídia, e acima de tudo um palanque, onde
oradores diriam mais ou menos o que se esperava que dissessem. Havia um centro.
Nada contra essa visão do mundo, só que é muito copernicana.
O mundo não funciona de maneira tão simples. O fato de existirem criaturas e
sistemas com aspecto de mandala não quer dizer que esse seja o estilo preferido
da Natureza. Vai ver que às vezes ela se baseia em algoritmos químicos. Vai ver
que às vezes se baseia numa eletromagnética binária do espaçotempo, e por cima
dela um sistema retroalimentador e motoperpetuante chamado Vida.
A multidão não tem um centro pelo simples fato de que grande
parte das coisas da Natureza não o tem. Suas características são outras. A
multidão pode ser vista como uma câmara cheia de gás, lacrimogêneo ou não, onde
é possível comprimir cada vez mais o gás e fazer suas moléculas, mais apertadas
umas às outras, movimentaram-se num ricochete cego como o de bolas de pinball.
A multidão não é centro, é fatia estatítica de um Todo que é
cada vez mais mapeado e investigado com fervor. Daí a importância de institutos
de pesquisas e de coleta de dados porta-a-porta, algoritmos qualificadores,
sistemas de amostragem mais sutis. Hoje a Presidente Vargas fica cheia e não se
vê sistema de som, político ou palanque. Não existe Big Bang, não existe
centro, não existe o Monarca de qualquer regime político. A multidão mostra que
por baixo dessas Unidades aparentes o mundo é torvelinho perpétuo. Não tem
rosto, tem coreografia e fluxo.
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