sexta-feira, 25 de novembro de 2011

2723) “O Grande Tertiano” (25.11.2011)




É um conto antigo do grande Anthony Boucher, escritor de romances policiais e de ficção científica, crítico, editor e, incidentalmente, o homem que fez a primeira tradução e publicação de Jorge Luís Borges nos EUA. 

“The Greatest Tertian” (1952) é um conto em forma de artigo acadêmico de um pesquisador de uma civilização alienígena do futuro, estudando as lendas longínquas do distante planeta Terra. 

Nesse futuro, a história da Terra se diluiu em lendas confusas e somente dois terrestres (=tertianos) ainda são lembrados. O primeiro, conhecido como Shark Oms, era um detetive de rara inteligência, que desvendava os crimes mais complicados. O segundo, chamado Shark Sper, era um dramaturgo e poeta que escreveu as maiores comédias e tragédias do teatro de seu tempo.

O lance de ousadia acadêmica do autor do artigo consiste num raciocínio indiscutível. Ele aponta o fato de que essas duas figuras lendárias viveram na mesma cidade terrestre, chamada “Londres”, em datas, segundo os registros, muito próximas. Sabem-se centenas de episódios da vida do detetive Shark Oms, mas nenhum dos seus escritos sobreviveu. Por outro lado, preservou-se toda a obra do dramaturgo Shark Sper, mas quase nada de sabe sobre sua vida. Ora (pergunta o autor), isto não sugere que os dois são um único indivíduo? 

Esse indivíduo seria “o grande tertiano”, famoso pelas suas deduções brilhantes e pelos seus versos geniais.

O conto de Boucher ironiza as nossas tentativas de interpretar os farrapos de evidências que temos a respeito de civilizações desaparecidas. Pedaços de biografias, datas contraditórias, fatos cheios de lacunas, versões conflitantes que às vezes coincidem num ponto secundário, nomes que soam de um jeito parecido e podem ser o mesmo... 

A idéia (um tanto borgiana, com um viés satírico) de considerar que Sherlock Holmes e Shakespeare foram a mesma pessoa não está muito longe dos estudos de hoje em dia tentando determinar a existência de um imaginário poeta chamado Homero que teria escrito a Ilíada e a Odisséia

Lembra também uma especulação de Carl Sagan (acho que no livro Cosmos) ao falar das tragédias de Ésquilo ou Sófocles, das quais só conhecemos um pequeno número. Diz Sagan que é como se uma civilização futura ouvisse falar em Shakespeare mas só tivesse preservado peças como Timon de Atenas, Bem está o que bem acaba, Coriolano, e tivesse vagas referências a textos perdidos com os títulos de Hamlet, Rei Lear ou Romeu e Julieta

A história é uma montagem de cacos e farrapos, feita, em partes iguais, de deduções como as de Sherlock Holmes e de uma imaginação criadora como a de Shakespeare.






Um comentário:

Paulo Rafael disse...

Vou procurar esse conto, não conhecia.