quarta-feira, 13 de outubro de 2010
2372) Colégio de Brotos (13.10.2010)
Oscarito é a cara da chanchada brasileira, e uma coisa que ele fazia muito bem era macaquear o discurso pomposo, fosse científico ou político. No começo de Nem Sansão nem Dalila ele aparece como um professor universitário dando uma aula sobre o Tempo, e utilizando-se do Paradoxo de Zenão, que Jorge Luís Borges cita a três-por-dois em sua obra. Em Colégio de Brotos de Carlos Manga (1956), ele é Agapito, o zelador de um colégio interno. Em sua primeira aparição na tela, está fantasiado de professor, empunhando uma caveira, e dando para uma sala vazia uma aula sobre as teorias de Lombroso, para quem um criminoso tinha sempre um conjunto característico de traços faciais.
Colégio de Brotos foi sucesso naquela época, e um dos meus filmes preferidos quando garoto. Dele eu lembrava, acima de tudo, uma cena que se passa no museu do colégio, quando Oscarito entra lá à noite e é ameaçado seguidamente por uma armadura medieval, estátuas de guerreiros primitivos, e uma múmia. No fim descobre-se que era o vilão, infiltrado no colégio para roubar umas moedas raras, mas mesmo na época eu ficava me perguntando se o vilão se vestia de múmia e ficava à espera, para o caso de alguém entrar ali de madrugada.
Essas incoerências são a coisa mais encantadora do filme B, uma vez que os filmes A têm na equipe alguém para cortar tudo que não tenha uma explicação lógica. Vai daí que as chanchadas da Atlântida tinham de vez em quando essa saborosa imprevisibilidade. Por exemplo: o filme se passa num colégio interno, onde estudam rapazes e moças, todos dormindo nos respectivos alojamentos (assim como os professores); mas eles chamam aquilo o tempo todo de “universidade” e “faculdade”. E à noite alunos e professores ficam dançando numa boate (visivelmente dentro do colégio) ao som de uma orquestra!
Sérgio Augusto, no indispensável Este Mundo é um Pandeiro (Cia. das Letras, 1989), diz que o filme se inspira em Escola de Sereias (“Bathing Beauty”, 1944, filme de George Sidney com a anfíbia Esther Williams). O filme de Manga é uma chanchada curiosa, porque não se passa no Rio, ou pelo menos em nenhum momento se fala no Rio. Como o astro do filme é Francisco Carlos, a ação se divide entre o colégio, com boate e tudo, e uma emissora de rádio onde ele faz carreira. As únicas cenas externas são os jardins do colégio, onde rapazes e moças caminham sobraçando livros e cadernos, e, à noite, sentam nos gramados, ouvindo Francisco Carlos cantar serenatas. A noção de espaço e de tempo do filme B, principalmente o brasileiro, merece uma tese de mestrado. No caso de Colégio de Brotos, não sei se alguma universidade brasileira dos anos 1950 se parecia com aquele ambiente, e por que motivo é chamada de “colégio”. Há rapazes de terno, e há rapazes de pulôver, inclusive Augusto César Vanucci e Daniel Filho fazendo papéis, bem diluídos, de quase vilões. Por um lado, uma chanchada típica; por outro, um filme único e curioso.
Assinar:
Postar comentários (Atom)
2 comentários:
Caro Braulio, possivelmente a utilização do termo "colégio" para definir "universidade ou faculdade", nesse filme, tenha sido mais uma macaqueada nossa do termo "college" que os gringos tbm usam pra se referir à faculdade.
Ruy.
Eu pensei isso, Ruy, porque eles usam "college" mais como sinônimo de universidade, enquanto o colégio secundário é "school". O que eu não sei é se era comum, em 1956, universidades brasileiras no sistema de internato, com dormitórios, alojamentos de rapazes e de moças, etc. Agora, com boate... isso eu garanto que não tinha.
Postar um comentário