(o crítico John Clute)
Antonio Cândido já elogiou com admiração o resenhador de
livros, o crítico do varejo semanal, que escreve sobre o que vem parar em cima
da sua mesa na redação. Dizia ele: “Não é fácil escrever todas as semanas sobre
livros do dia, feitos muitas vezes por autores desconhecidos, a respeito dos
quais não se tem a menor referência. Por isso digo que um crítico como Álvaro
Lins, que acertava sempre e produzia artigos bem escritos, de grande densidade
e destemor, enfrentava dificuldades maiores do que, por exemplo, Augusto Meyer,
que escrevia não sobre o livro da semana, de autor frequentemente desconhecido,
mas sobre Camões, Cervantes, Machado de Assis, Dostoiévski, Pirandello,
Rimbaud.”
Deve ser mais cômodo trabalhar com os clássicos, ou com
textos em domínio público, do que com autores de carne e osso, cheios de
opiniões, mas a questão nem é essa. A crítica e a teoria se desvalorizam quando
passam longe da literatura. A crônica jornalística impõe a quem a escreve o
contato com o inesperado. Escrever sobre um dado que gira e que não se definiu
ainda, e que às vezes cabe a nós traçar o seu primeiro perfil.
O crítico John Clute diz: “Acho que a tentativa de captar e definir
o que existe de ‘historiável’ em um texto novo, que é o que se espera dos
resenhadores, é absolutamente inerente a qualquer compreensão de um texto
qualquer. E acho que a crítica acadêmica, que tende a abstrair, em proporções
industriais, temas a partir dos textos (numa espécie de mineração), tende a
tropeçar logo na primeira barreira: a tarefa de descrever como um conto se
livra contando do seu fardo. Porque se você não conseguir transmitir essa parte
essencial, esse ‘como’, você só pode discutir em cima de uma generalização
fatalmente vazia, desgarrada.”
Alguns ficcionistas produzem textos críticos muito lúcidos e
demonstram conhecer o gênero com que trabalham. Stephen King, Lovecraft, Henry
James etc têm inclusive talento para a descrição sintética, resumindo em poucas
linhas o sentido ou o impacto de um livro. Autores comentando livros alheios
costumam ter uma abordagem mais pragmática, indo direto ao ponto, falando não
como autores, mas como leitores.
Um comentário:
Nunca houve crítico de cinema como Pauline Kael: ao ler qualquer resenha sobre algum filme já visto antes, tinha que rever minha visão. Ela reposicionava qualquer espectador - diante de gêneros, de roteiros, direção ou atuações. Um filme resenhado por ela está sempre em seu devido lugar, méritos e/ou deméritos (muitas vezes invisíveis/despercebidos/mal interpretados por nós) apontados com brilhante precisão. 1001 Noites no Cinema (nos EUA 5000 Noites) é um altar para todo cinéfilo. Rara acuidade, resenhas antológicas e definitivas, admirável lucidez que o Alzheimer apagou. O que a Kael não diria do cinema infantilizado de hj? Nos diga vc, Braulio, baita resenhador. Abração!
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