(ilustração: Igor Morski)
Matilde Varandello, 34 anos, estilista, de Londrina: recorta
e prega em álbuns tamanho grande as matérias e as fotos que mais gosta a
respeito de suas cantoras preferidas, cuja última listagem alinhou 73 nomes.
Argeu Valadares, 43 anos, comerciante, baiano: pega a vara e
vai pescar. Com isca ou sem isca, não se
abala e vai pescar. Tenha ou não tenha peixe, tenha ou não tenha mar, daqui a
um milhão de anos a Humanidade já se extinguiu mas Argeu Valadares vai pescar.
(E a Humanidade que se extinga.)
Jamima Durães, 32 anos, psicóloga, São Paulo, dialoga com os
bancos de metrô. Reproduziu as plantas baixas dos trens, deu um nome a cada
vagão e a cada banco, e, quando senta em qualquer um deles profere uma prece
ligada àquele banco específico.
Mário Alenquer Fortunato, 58 anos, contabilista, Rio. Sabe
de cor um disco inteiro de uma cantora americana, arranjos, letras, tudo, e
qualquer problema que desabe sobre ele o obriga a cantar o disco faixa por
faixa, a plenos pulmões quando em casa, em voz bem baixinha quando nos
cubículos do escritório.
Hermán Montero, 56 anos, jornalista aposentado venezuelano.
Recorta palavras aleatórias das manchetes dos jornais e monta com elas poemas
surrealistas em forma de notícias bizarras.
Paulo César Costa Carvalho, 43 anos, representante de
vendas, Junco do Seridó. Onde quer que haja um intervalo, puxa do bolso do
paletó uma revistinha com problemas de Sudoku, que ele resolve e depois não
consegue lembrar como resolveu, de tão distraído que fica.
Vanilda Borges Lima, 44 anos, professora, capixaba, costuma
ter uns apertos no peito contra os quais reage preparando um chá de camomila de
três saquinhos para meia chaleira dágua, depois polvilhar com canela e uma
gotinha de mel, é tomar três e capotar até a chegada da diarista.
Nelson Barbosa Olivetto, 61 anos, fotógrafo aposentado,
todas as vezes que está numa fila muito longa dedica-se a lembrar a letra de
“Construção” de Chico Buarque, e depois a repete mentalmente de trás para
diante.
Léia Donato Filgueiras de Sousa, 27 anos, está construindo
um palácio da memória, embora não lhe dê este nome; e lembra com nitidez cada
coisa que botou em cada recanto ou parede de cada aposento da casa que ela
imaginou para si.
2 comentários:
Adorei me colocar em cada um desses lugares outros...
Detalhes cotidianos - ali nos cantinhos recônditos é que mora a poesia.
Postar um comentário