Toda noite, na novela América, ouço alguém cantando: “Um poema ainda existe, com palmeiras, com trincheiras, canções de guerra, quem sabe canções de mar, ay, hasta te comover...”
Soy Loco por ti, América:
Gravação original: https://www.youtube.com/watch?v=VKWnJG1UaTc
E recordo uma entrevista que dei anos atrás. Uma moça atenciosa me perguntou:
-- Que tipo de canções você faz? Maracatu, rock, forró?...
E eu disse:
-- Olha, eu sou letrista. Eu não classifico minhas canções pelo ritmo delas. O ritmo pode ser qualquer um, e pra falar a verdade eu às vezes nem sei que ritmo é aquele que eu estou usando. Eu classifico minhas canções pelo assunto. Por exemplo: tem canção de amor, canção de bebedeira, canção de jactância...
Com olhos muito arregalados, ela me pediu para cantar uma canção “de jactância”. Eu cantei uma música minha que diz:
Sou o bote da cobra caninana,
sou dentada de tigre enraivecido,
sou granada que solta um estampido
que se escuta por mais de uma semana...
E assim por diante. Jactância pura.
Os críticos de música entendem mais de música do que de letra, e é natural que eles tendam a classificar as canções de acordo com ritmos. Mas eu acho, pegando o exemplo acima, que “canções de guerra” é uma classificação tão legítima quanto “xaxados” ou “valsas”. Elas existem, não é mesmo?
Você pega por exemplo “Cantiga Brava” de Geraldo Vandré, aquela canção devastadora da trilha sonora do filme A Hora e a Vez de Augusto Matraga:
O terreiro lá de casa
não se varre com vassoura...
Varre com ponta de sabre,
bala de metralhadora!
Ave Maria! Eu já cantei isso em mesa de bar, no tempo da ditadura, e o que salvou a ditadura foi o fato de que a gente não andava armado, porque a adrenalina que essa música produz não está no gibi.
"Cantiga Brava":
https://www.youtube.com/watch?v=09bZl8Rr-NQ
A canção de guerra mais famosa é a “Marselhesa”, o hino da França. A gente vê os franceses são delicados, tão gentis – comandalevú, sivuplé... Cuidado, amigos. O hino deles diz:
Vejam esses soldados ferozes!
Eles estão vindo degolar nossos filhos
e nossas companheiras!
Às armas, cidadãos! Formem os batalhões!
Marchemos, marchemos,
e que um sangue impuro regue o nosso chão!
Não, amigos, eu só piso nos calos de um francês se tiver Vandré me dando cobertura.
A cena da Marselhesa em "Casablanca":
https://www.youtube.com/watch?v=KTsg9i6lvqU
Canções de guerra do lado oposto (contra a guerra) são clássicos da música de protesto como “Masters of War” de Bob Dylan ou “I don’t want to be a soldier” de John Lennon. Se formos para o lado pacifista, “do contra”, não vamos parar mais nunca.
"Masters of War":
Gravação ao vivo: https://www.youtube.com/watch?v=exm7FN-t3PY
Letra: http://www.azlyrics.com/lyrics/bobdylan/mastersofwar.html
"I don't want to be a soldier"
Gravação original: https://www.youtube.com/watch?v=mf44CHE31Gc
Letra: http://www.azlyrics.com/lyrics/johnlennon/idontwanttobeasoldier.html
Minha canção de guerra preferida é “Ride across the river” do Dire Straits (CD Brothers in Arms). Dois personagens. Um diz ser o defensor da liberdade, lutando por uma causa nobre e justa; o outro diz ser um mercenário, que mata a serviço de qualquer um que o contratar. E o poeta conclui:
Ninguém vai detê-los, enquanto dia e noite se sucedem.
O certo vira errado; a esquerda vira a direita.
E eles cantam ao marchar, bandeiras desfraldadas.
Hoje as montanhas, e amanhã o mundo.
Quem é um, quem é o outro? Não sabemos; só sabemos que estão cruzando o rio, rumo à batalha final.
"Ride across the river":
Gravação original: https://www.youtube.com/watch?v=rSZzyGXCTQk
Letra: http://www.azlyrics.com/lyrics/direstraits/rideacrosstheriver.html
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