Como todo intelectual, sou muito desconfiado com essa história de emoção. Não porque não as tenha ou porque não goste delas, defeito que erroneamente se atribui aos intelectuais. Reconheço que muitos deles fogem das próprias emoções com a mesma velocidade com que o Dr. Jekyll fugia de Mr. Hyde, mas a mim pelo menos o que me irrita é o fato de a mídia e a publicidade usarem as emoções com a mesma insistência com que usam a bunda feminina. É um chamariz infalível, uma isca tentadora abanada diante dos olhos dos incautos.
“Emoção” é a senha pavloviana para amarrar os telespectadores à poltrona, fazê-los salivar, ou pelo menos as tevês pensam assim. “E não perca hoje, todas as emoções da Fórmula-1!” “Veja estas e muitas outras emoções no Fantástico!” “Tele-Cine: todas as emoções para você!”
E a pergunta obrigatória para quem ganhou um prêmio ou um campeonato, para quem casou, para quem recebeu um coração novo, para quem escapou de sequestro, para quem tirou a raspadinha, para quem teve um filho: “E aí, como foi essa emoção?...”
Eu acho que repórter de TV, ao assinar a carteira, recebe um memorando dizendo: “Prezado repórter: Pergunte sempre pela emoção. Se perguntar o que a pessoa achou, ela pode vir com uma idéia, uma opinião, ou outra surpresa igualmente incômoda. Pergunte pela emoção, insista na emoção, e se ela começar a chorar estale o dedo para o câmara, para que ele dê um zoom na lágrima.”
Nada contra as emoções. A emoção que eu mais gosto, por exemplo, é alegria. Quando eu estou alegre escrevo uma coluna destas em dez minutos. Mas o massacre mental promovido pela publicidade e pela mídia nos transformou em robôs cheios de botõezinhos mentais que a TV (e não só ela, claro) utiliza como lhe convém.
Já falei aqui (“O indutor emocional”, 28.5.2003) no papel idiota que a música se vê obrigada a exercer nas novelas de TV, “ensinando” ao espectador que agora é uma cena triste, agora é uma cena para achar graça, agora é uma cena onde vai haver um susto...
Como o cachorro do Dr. Pavlov, que bastava tocar a sinetinha para ele lembrar da comida e começar a produzir saliva sem ver comida alguma, a TV de hoje toca sinetinhas musicais para nos emocionar quando não existe nenhum motivo dramatúrgico para essa emoção. Se não tiver a musiquinha engraçada, ninguém ri, porque engraçada a cena não é. Se não tiver a música triste, ninguém chora, porque a cena não é triste, é constrangedoramente mal escrita e mal interpretada. (Nem todas, claro.)
E o argumento que já ouvi tantas vezes é: “As pessoas precisam de certeza. Esse negócio de ficar em dúvida, de ficar hesitando entre duas interpretações, é pra cinema, onde o cara está preso na poltrona até o fim da sessão. Na TV, se o sujeito passar meio minuto sem entender o que está se passando, ele pula para outro canal.”
Quando ouço isso, a vontade é de pular no Canal da Mancha, com uma TV amarrada no pescoço.
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