Se eu morrer algum dia, o que espero que jamais aconteça, ninguém venha me fazer homenagens tipo botar nome em rua. Sou contra. Toda vez que aparece um projeto de nome-de-rua para um figurão que acabou de falecer, são duas as famílias enlutadas: a do recém-falecido e a do morto antigo cujo nome foi desalojado para dar lugar ao nome do morto recente. Até parece que quando o cara morre desaparece, e deixa em seu lugar apenas o nome, uma tralha enorme e incômoda atravancando os corredores da Prefeitura, e que a única maneira de se livrar daquilo é botando o nome do sujeito em algum lugar.
Aqui no Rio o caso mais polêmico foi o de Tom Jobim, cujo nome quiseram dar à Avenida Vieira Souto. Claro, o maestro merecia homenagens, mas quando a mudança foi anunciada a família Vieira Souto pintou-se para a guerra, empunhou as machadinhas e foi à luta. O nome não foi mudado, e o nome de Tom acabou indo para o aeroporto do Galeão, que aliás continua a ser Galeão para o povo e Tom Jobim para a imprensa e as autoridades.
Não se discute se a homenagem é merecida ou não. Geralmente é. O problema é que além de dar confusão, não pega. Quer ver, entre num táxi aqui no Rio, num domingo de tarde e diga ao motorista: “Vamos para o Estádio Mário Filho”. Ele vai dar um ligeiro branco e se sentir na obrigação de perguntar: “O sr. quer ir pro Macaranã, não é isso?” Chegando ao Recife, não adianta perguntar pelo Cais Martin Luther King: na boca do povo, continua a ser o Cais do Apolo, e fim de papo. Ninguém tem nada contra o homenageado, longe disso. Mas eu acharia muito estranho se alguém de repente mudasse o nome da Praia de Copacabana para, por exemplo, Praia Rubem Braga. Nem a praia nem Rubem merecem isso.
A polêmica atual no Rio é a mudança do nome “Circo Voador” para “Circo John Lennon”. Quem me conhece sabe que John foi meu amigo de infância, portanto nada tenho contra homenagens prestadas a ele. Mas trocar o nome do Circo Voador é como trocar o nome do Maracanã. Mário Filho foi um batalhador pela construção do estádio, além de ter sido um dos melhores cronistas esportivos que este país já teve (meu pai o achava superior ao irmão Nelson Rodrigues). Ninguém tem nada contra os homenageados, mas contra a substituição de um nome original e criativo como “Maracanã” ou “Circo Voador” pelo nome de quem quer que seja.
Além do mais, a boca do povo é impiedosa. Quando se dá o nome de alguém a uma instituição o mais provável é ele virar substantivo comum. “Pinel” era nome de médico, virou nome de hospital, e acabou como sinônimo de doido: “Fulano está pinel”. Na medicina há o duvidoso costume de dar às doenças o nome de quem as pesquisou mais a fundo: doença de Chagas, mal de Parkinson... Acho um conceito meio esquisito de homenagem. Eu não gostaria de ver, num quarto de hospital, uma pessoa deitada na cama e uma enfermeira cochichando para a outra: “É um caso grave de Braulio Tavares”. Eu, hein.
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