sexta-feira, 27 de julho de 2012

2934) "O Torreão" (27.7.2012)



Este romance de Jennifer Egan, lançado agora pela Ed. Intrínseca, tem uma estrutura narrativa inesperada que só vai se revelando aos poucos, misturando duas histórias que soam incrivelmente reais embora uma dela possa ser fictícia.  Em princípio, estamos acompanhando a viagem de Danny King, um “hipster” de Manhattan, a um país da Europa Central, para onde seu primo Howard o convidou com a proposta de trabalhar na restauração de um antigo castelo e transformá-lo num hotel de luxo. Danny e Howard são amigos de infância, mas na adolescência houve um episódio traumático entre os dois, que enche Danny de culpa e de incerteza, porque ele não sabe ao certo as intenções do primo (que agora é riquíssimo, e que ele não vê há muitos anos) ao chamá-lo para aquele lugar remoto.

Esta história vai se misturando aos poucos com a história de um presidiário nos EUA, Ray, que está fazendo uma oficina de escrita criativa na cadeia e começa a botar uns olhos compridos na direção da professora, Holly. Não vou esmiuçar aqui o modo como essas duas histórias se misturam, porque este é um dos truques principais do livro, que é escrito com um controle e uma alegria imaginativa raros hoje em dia.  A crítica o classificou como “romance gótico”, pela presença central do castelo e do seu Torreão cheio de mistérios.  A incursão de Danny King pelo castelo reproduz a incursão de Jennifer Egan pelo gênero gótico: uma pessoa moderna, conectada, penetrando num ambiente com séculos de existência e de história acumulada.  

Esse oposição entre o antigo e o modernoso é uma das polaridades deste livro que fascina e desconcerta, embora este último termo deva ser tomado no melhor dos sentidos.  Egan é uma narradora onisciente que nunca aparece, embora a vejamos manipular os personagens, como aquelas pessoas de preto que seguram os personagens em certos teatros de bonecos: visíveis o tempo todo, mas podemos abstrair sua presença no instante que quisermos.  Este romance concilia o melhor de certa literatura experimental (a busca de modos não convencionais de contar uma história) e da literatura clássica (personagens envolventes, peripécias cheias de suspense). Há um trecho, uma simples linha na página 207 do original inglês, em que o uso de um mero pronome muda o livro inteiro, faz um monte de peças se encaixarem e um monte de fichas caírem. Isto só ocorre em livros ousados, que se atrevem a executar um número de malabarismo na corda-bamba, com pleno domínio da técnica. Um bom livro é aquele que a gente lê a última página às 4 da manhã e volta atrás para reler, porque percebe que a segunda leitura vai ser mais recompensadora do que a primeira. 

3 comentários:

Fraga disse...

Bah, Braulio, vai me fazer comprar. Gracias pela isca.

José Roberto Torero disse...

Comprei, li e gostei. Valeu a indicação.

Braulio Tavares disse...

Bom livro, não é mesmo? Fiquei interessado nas outras coisas dela. Tem este outro aqui:
http://mundofantasmo.blogspot.com.br/2011/01/2463-um-conto-em-power-point-2612011.html