segunda-feira, 19 de abril de 2010
1933) Leonard Cohen (20.5.2009)
Num show recente em Londres, o poeta-compositor Leonard Cohen disse ao público: “Cantei aqui pela última vez há quinze anos. Naquele tempo eu era apenas um jovem, cheio de entusiasmo e ilusões”.
A graça está no fato de que o último show de Cohen na Inglaterra foi feito quando ele tinha 60 anos, e hoje ele volta aos palcos com 75.
Nada mau para quem já foi chamado “o poeta mais sisudo do rock”. Durante os anos 1970, aquela década cheia de glamour e purpurinas e roupas psicodélicas e androginia e guitarras estridentes, as canções introspectivas e monótonas de Cohen eram absorvidas por uma minoria de gurmês para quem substância e sabor valiam mais do que pose e aparência.
Cohen é comparado a Bob Dylan, pela qualidade de suas letras, mas a atitude dos dois para com a música não poderia ser mais diferente.
Dylan sempre foi um camaleão musical; experimentou todos os estilos, do country ao rock, do gospel ao blues, da valsa à balada. Há quem não o considere bom cantor (eu acho que foi um ótimo cantor em diferentes fases de sua carreira, e não o é mais), mas ele sempre teve uma abordagem de cantor ao interpretar as próprias músicas. Bem ou mal, o ato de cantar parecia mais importante para ele do que o ato de compor.
Um dos melhores analistas de sua obra, Paul Williams, desenvolveu ao longo da série de livros Bob Dylan, performing artist a tese de que para Dylan a canção gravada em estúdio era apenas uma versão provisória para algo que só iria acontecer de verdade, e imprevisivelmente, quando ele subisse ao palco.
Cohen, que nunca foi um cantor com a mesma vitalidade e versatilidade de Dylan, é hoje aos 75 anos o mesmo cantor contido, meticuloso e incisivo que era há meio século.
Seus discos saíram de forma irregular no Brasil, mas é possível ver no YouTube performances suas com trinta ou quarenta anos de intervalo, cantando a mesma canção, com a mesma articulação cuidadosa dos versos, reforçando pequenas sutilezas ou duplos sentidos ou ironias poéticas, das quais ele é um mestre completo. A voz está rouca, é claro, o rosto parece um pergaminho zen-budista, mas a suavidade no canto é a mesma.
Ao contrário de Dylan, que parece recusar-se a repetir a mesma melodia em duas execuções da mesma canção, Cohen parece ter dedicado toda a vida a lapidar as mesmas notas, como João Gilberto.
Dylan é mais compositor, porque mais musical, mais flexível e mais eclético. As canções de Cohen são mais “quadradas” e “caretas”, para usar termos da época em que ele surgiu. Seguem o esquema de estrofes sucessivas com a mesma melodia e letra diferente, intercaladas às vezes por um refrão. Um esquema que Dylan usou mas que também explodiu em variantes incontáveis.
Cohen é mais conservador nesse aspecto estrutural. Se ele tem uma canção de sete minutos, com um minuto e meio o ouvinte já sabe que vai ser aquilo até o fim, só que com versos diferentes. Quê que tem? Os versos dele estão entre os melhores do seu idioma no século 20.
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3 comentários:
Texto maravilhoso sobre um dos maiores da música mundial de todos os tempos.
Te agradeço, Bráulio, pelo prazer que me proporcionou com seu texto.
Valeu!!!
Marcello Lacerda
Valeu, Marcello. A música de Cohen, ainda bem, ficará para sempre.
excelente análise comparativa - Cohen/Dylan. Gosto de ambos, de forma diferente.
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