segunda-feira, 12 de janeiro de 2009

0741) A natureza humana (3.8.2005)


(Mikhail Bakunin)

Leio no blog do jornalista Ricardo Noblat uma citação do anarquista russo Mikhail Bakunin, um trecho que parece ao dono do blog (e a mim também) imbuído de um ominoso sentido profético. Diz Bakunin: "Assim, sob qualquer ângulo que se esteja situado para considerar esta questão, chega-se ao mesmo resultado execrável: o governo da imensa maioria das massas populares por uma minoria privilegiada. Esta minoria, porém, dizem os marxistas, compor-se-á de operários. Sim, com certeza, de antigos operários, mas que, tão logo se tornem governantes ou representantes do povo, cessarão de ser operários e pôr-se-ão a observar o mundo proletário de cima do Estado; não mais representarão o povo, mas a si mesmos e suas pretensões de governá-lo. Quem duvida disso não conhece a natureza humana."


Pensou o mesmo que eu pensei, caro leitor? Então, passemos adiante. Tudo bem: é a natureza humana. Mas a natureza humana será só isto? Marx, um sujeito furiosamente otimista, dizia que não. Que os nossos valores éticos são condicionados pelo ambiente moralmente poluído do capitalismo, onde a lei é “cada um por si e Deus contra”, onde para ganhar dinheiro o sujeito é capaz de vender a mãe e dar a sogra de brinde. Nesse clima de competitividade feroz, e de fácil enriquecimento uma vez que se chegue a determinada altura da “escada social”, todo mundo é corrompível, todo mundo tem um preço. Mas (prosseguia o barbudo redator da “Gazeta Renana”) com o advento do socialismo tudo seria diferente. O socialismo e sua conseqüência final, o comunismo, iriam instituir um novo clima moral, uma nova super-estrutura de valores, idéias e princípios.

Bem, isso para mim é tão válido quanto dizer que no ano 2500 teremos colonizado Marte e que lá o cinema vai ser de graça e o futebol não vai ter impedimento. Ou seja: a previsão é tão a-longo-prazo que de certo modo se auto-invalida, porque daqui até lá, como naquela história popular, “ou morro eu, ou morre o rei, ou morre o burro”. Nunca saberemos como será a “natureza humana” daqui a cem ou duzentos anos, e só podemos lidar com o que temos à mão agora. A frase de Bakunin aplica-se a operários que chegam ao Poder, mas poderia aplicar-se também a sociólogos de esquerda que chegam ao Poder, ou a católicos apostólicos romanos que chegam ao Poder. Não importa sua origem ou suas idéias anteriores: o Poder é uma espécie de kryptonita que anula suas qualidades e nivela a todos diante de uma máquina surda, cega e muda, uma máquina secular de auto-enriquecimento.

Dinheiro é a mais perigosa das drogas. Vicie um cara em dinheiro, e ele fará de tudo para conseguir mais. A maior parte de nós não vive sem uma dosezinha no fim do mês, não é mesmo? Dinheiro é perigosíssimo, inclusive porque dá aos viciados aquela ilusão de onipotência tão característica de algumas drogas. Não existe “natureza humana”: existem as “culturas humanas”, e quando viciadas em dinheiro elas ficam entregues aos traficantes de sempre.

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