Os prêmios literários funcionam de maneira semelhante aos prêmios cinematográficos, musicais, teatrais, etc. Um grupo de jurados se reúne e escolhe as melhores obras, geralmente as obras lançadas num período específico (o ano tal, etc.). Os jurados mudam a cada ano. A obra que foi premiada agora, pelo grupo X, talvez não o fosse no ano passado, ou no ano que vem, avaliada por outras pessoas.
Os prêmios de ficção científica dos EUA são atribuídos a
textos de diferentes extensão: os critérios geralmente são “Melhor Romance” (“Best
Novel”), “Melhor Novela” (“Best Novella”), “Melhor Noveleta” (“Best Novelette”),
“Melhor Conto” (“Best Short Story”).
Essa subdivisão é problemática, sim, do ponto de vista
literário, mas os organizadores cravam um critério numérico que todo mundo
aceita, e isto ajuda a colocar cada texto em sua gavetinha. Na última vez que
chequei, os parâmetros estavam assim:
Conto: até 7.500 palavras.Noveleta: entre 7.500 e 17.500 palavras.Novela: entre 17.500 e 40.000 palavras.Romance: de 40.000 palavras em diante.
(Jonathan Lethem)
Dentro da própria ficção científica existe uma discussão
(puxada por Jonathan Lethem) sobre quais teriam sido os caminhos do gênero se o
Prêmio Nebula de 1973 tivesse sido concedido não a Encontro com Rama de Arthur C. Clarke, como de fato aconteceu, mas
a O Arco-Íris da Gravidade de Thomas
Pynchon, que também estava entre os indicados.
Mais detalhes aqui:
https://hipsterbookclub.livejournal.com/1147850.html
Aproveito para lembrar que até Jorge Luis Borges já foi
indicado para este prêmio de FC, e fico imaginando sua reação sarcástica se
tivesse ganho. (Foi com “Utopia de um Homem Cansado”, em 1976; Borges perdeu
para “Catch that Zeppelin!” de Fritz Leiber, um grande escritor hoje
esquecido.)
A existência de obras ambíguas dessa natureza produziu
centauros conceituais como o termo “literary science fiction”, contraposto a
“genre science fiction”, ambos já fazendo parte do vocabulário resenhístico de
revistas como a Locus.
Existem muitos jovens (=pessoas mais novas do que eu) em
busca de um tema para tese ou dissertação acadêmica. Se eu tivesse mais anos
pela frente eu me dedicaria a estudar esse curioso fenômeno dos gêneros literários,
que são cistos populares dentro da literatura “propriamente dita” (há um
esnobismo deliberado nesta expressão).
O texto impresso, pós-Gutenberg, ao mesmo tempo
popularizou o livro (onde havia 100 cópias manuscritas de uma obra passou a
haver 100.000 impressas) e o elitizou (o livro impresso também não é acessível
a todo mundo – somente a quem é
alfabetizado e tem algum dinheiro).
Os prêmios literários são apenas uma entre muitas
instâncias em que existe a literatura literária (uma espécie de Sala Vip para quem
preenche uma série de requisitos) e a literatura de gênero, ou popular, ou
popularesca, ou de massas, ou de entretenimento. A primeira delas inveja as
vertiginosas vendagens da segunda. A segunda inveja a visibilidade, a
respeitabilidade e as honrarias concedidas à primeira.
Um prêmio é importante? Sem dúvida. Há prêmios em
dinheiro que podem equilibrar as finanças de um autor para o resto da vida. (Este, claro, é o ponto de vista de um septuagenário.)
Há prêmios onde a remuneração é modesta, ou simbólica;
mas a repercussão é grande, junto à imprensa e ao público. Um prêmio pode fazer
decolar uma obra de valor que até então estava na obscuridade. Foi o que
aconteceu com Jorge Luís Borges ao ganhar na Europa o Prêmio Formentor, aos 61
anos. Do dia para a noite o mundo inteiro tomou conhecimento dos contos que ele
tinha escrito vinte anos atrás.
Cada prêmio tem seu viés. Voltando ao território da
ficção científica, o Prêmio Hugo é votado pelos fãs, pelos leitores, no
contexto da Convenção Mundial de FC que se realiza todo ano. É um prêmio de
popularidade, por assim dizer. O Prêmio Nebula é votado pelos membros da SFFWA,
entidade que reúne escritores, editores, críticos, etc., nos campos da FC e da
fantasia; é um prêmio mais exigente em termos literários (em tese, pelo menos).
Eu tenho uma simpatia especial pelo Prêmio Philip K.
Dick, concedido anualmente ao melhor livro inédito publicado em formato de
bolso (“paperback”). Dick foi um grande escritor que publicou, nesse formato
“de pobre”, livros que hoje são clássicos da FC, re-publicados em edições de
luxo, caríssimas. Quem primeiro reconheceu seu talento, e apostou nele, foi o
livro de bolso.
https://hipsterbookclub.livejournal.com/1147850.html
2 comentários:
“Noveleta” é estranho demais. É como “mediozinho” ou “pequenão”.
Quando a finalizar uma retrodistopia estava preocupado em não atingir os 40k, porque o que escrevia devia ser um romance, não uma novela.
Passei o tal limite de palavras, mas antes já tinha uma carta na manga, iria utilizar o conselho do Marcelino Freire no quesito do "o que é?" quanto a crônica e conto: "Diga o que é, que mesmo não sendo, passará a ser."
Agora esse meu ROMANCE, uma FC leve e quase um fix-up está concorrendo descaradamente a um certo prêmio internacional. :)
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