quinta-feira, 19 de fevereiro de 2015

3738) Maratona Casablanca (15.2.2015)



Tenho amigos cinéfilos na Paraíba que costumam programar maratonas cinematográficas na casa de um deles. O detalhe é que são maratonas de um filme só, o mesmo filme rodando em sessões contínuas desde a chegada do primeiro conviva até a partida do último.  A duração disso depende da quantidade de presentes, além de outros fatores, mas não é extraordinário que vá das oito da noite às seis da manhã.

Esqueci de dizer que o local é ideal para isso, numa granja a 20km do centro da cidade, uma espécie de anfiteatro ou concha-acústica coberta, com capacidade para 36 poltronas, uma boa projeção, ótimo áudio, e no degrau de cima da arquibancada expande-se uma área servida por um barzinho acarpetado e discreto. Tanto é possível ficar sentado, vendo qualquer trecho do filme, quanto ir para aquela área, e geralmente isso acontece da segunda projeção em diante.

Na noite mais recente que eu fui o filme era Casablanca, que eu acho simpático mas, numa distribuição de senhas por ordem de importância, ele só ia ser atendido quinta-feira que vem.  Foi até melhor, porque depois de ver a primeira sessão integralmente (nisso eu nunca transigi, companheiros, meus princípios éticos continuam os mesmos: “Filme começado a ver é filme visto até o fim!”) tirei algumas horas conversando com meu clínico geral, com um amigo de minha filha mais velha e com dois ex-colegas de trabalho. 

Engraçado que toda vez na cena da Marselhesa a gente suspendia a conversa.  Era como se aquele nosso cinema fosse uma embaixada, um território diplomático, e a gente tivesse a obrigação etiquetal de respeitar o hino alheio.  Uma Marselhesa de filme B americano!  Grande prédio.

Fui olhar de novo a platéia às 3:15. Havia dois ou três casais de dedos fortemente entrelaçados, soprando o pó da sua Paris.  Alguns nerds silenciosos manipulando câmeras de celular, gravadores, cronômetros.  Tini copos com Pascoal, o dono da casa.  “Sempre sonhei com isso,” disse eu. “O Restaurante de Alice, né?” disse ele.  Uma piada antiga de quando o filme de Arthur Penn passou em Campina. Lá embaixo, na tela, a gigantesca mulher das nossas vidas embarcava, reprimindo um soluço.  Graças a Deus o nosso personagem estava de chapéu e sobretudo. Imagina uma despedida como essa, e o cara de camiseta e bermuda. Seria o juízo final.

“O filme bom,” estava dizendo Pascoal, “é aquele que a gente revê achando que desta vez, pode vir a acontecer uma coisa diferente. Que pode ter acontecido algo diferente naqueles dias em que imprimiram tantos metros de películas, aquelas noites em que se gravaram às pressas aqueles diálogos que estavam sendo lidos pela primeira e última vez.”




Um comentário:

Unknown disse...

Você sabe de onde foi tirada a cena da marselhesa????????
Do filme de JEAN RENOIR A GRANDE ILUSÃO de 1937.
Marcelo
Campina Grande