Nós éramos pálidos, cinéfilos, apolíticos, neuróticos e
noturnos; era como se estivéssemos implorando para sermos chamados “os zumbis”.
E eles eram sobranceiros, empedernidos, profundos, enciclopédicos e sonhadores,
e não é de admirar que a gente o chamasse “os pensadores”. E, como todo mundo na turma sabe, quem deu
esse nome fui eu.
Na verdade, éramos as editorias dos dois jornais de
Altavista (PB), o Diário Popular, reduto zumbi, e a Gazeta da Manhã,
quilombo dos Pensadores. O Diário defendia o simbolismo, o livre comércio, a livre iniciativa estética amparada
pela asa pública. A Gazeta pugnava por liberdade de associação, imunidades
sindicais, o regionalismo, o cooperativismo, e alguns estilos de canção popular. A cidade tinha um cinema, e a 2a.feira
era a Sessão Cult: o ingresso era mais caro e o filme mais problemático. Ambos
os jornais tinham que ver o filme e já na terça-feira publicar uma crítica
consagradora ou impiedosa.
Claro que éramos amigos-e-inimigos. A cidade era grande, mas
os jornais eram na mesma rua, com um botequim no meio do caminho. Bebíamos juntos, conversávamos, travávamos
polêmicas políticas ou por causa dos atributos de alguma atriz estrangeira que
nunca ouviu falar em nós e que se nos visse chamaria a polícia e a
carrocinha. Nunca uma frase foi travada
entre nós-todos que não fosse uma cuidadosa, sopesada, dissecada, bem avaliada
equação capaz de duplos e triplos sentidos e de triplos e quádruplos
mortais.
Um diálogo que ainda hoje, tanto tempo depois, ainda é
contado entre risadas foi aquele dia em que bebíamos (quatro, divididos em três
e um) Serra Limpa com ribaçã e entrou no bar o restante dos dois grupos,
encerrando um expediente intenso, após a sessão do filme, todos doidos pra
relaxar. Houve então, numa mesa, o
seguinte diálogo.
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