O filme de Kleber Mendonça Filho, O som ao redor, recebeu um dilúvio de elogios ano passado, e, talvez por conta disso, veio em seguida uma segunda onda de opiniões desdenhosas, no tom de “não achei essas cocacola toda”. Eu li pouquíssimo sobre o filme antes de vê-lo agora. Só sabia que era sobre um grupo de personagens espalhados por uma rua do Recife. Os elogios mais vigorosos foram feitos, em email, por W. J. Solha, o coronel Francisco do filme, que me elogiou o trabalho e o produto final, mas sem pistas do enredo. Por que insisto neste ponto? Porque quando a gente lê muito sobre o filme deixa de ter a experiência pura do filme. Ao invés de receber o filme na totalidade de cada momento seu, a gente fica esperando a cena da briga, esperando a cena da trepada, a cena do monstro, a cena da batalha... Resultado: não leio mais. Vou pro filme zerado.
Há uma cena em que o Dr. Anco está conversando com seu
sobrinho João; os dois trabalham como corretores de apartamentos. Anco diz que
lhe aconteceu uma coisa extraordinária. “Rapaz, fui mostrar um apartamento a um
casal, pois não é que a mulher era uma ex-namorada minha?! A gente namorou um
tempo, anos atrás, e o sexo com ela era bom demais, a gente fazia de tudo...
Ela agora tá casada, com dois filhos...”
Há uma pausa. João pergunta: “E depois?”. Ele: “Depois, nada. Foram
embora. Tu achasse pouco?” João: “Não, não. É ótima a história.”. O filme tem
esse perfil, e talvez isso tenha irritado muitos espectadores. Porque ele arma
situações que em outros filmes redundariam na cena da briga, na cena da
trepada, etc. E não de propósito não redunda em nada.
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