sábado, 25 de agosto de 2012

2958) O Cavaleiro das Trevas (24.8.2012)



O terceiro filme da série Batman dirigido por Christopher Nolan tem competência e tem pequenas frustrações. É um diretor criativo querendo injetar novidade numa fórmula da cultura de massas. Ele não pode injetar tanta novidade que cause um estranhamento nas platéias.  Nolan e seus produtores sabem muito bem que o que a maioria dos fãs de Batman querem é “um pouco mais daquilo mesmo”, mas não são todos.  Se hoje em dia os fãs aceitam que Batman leve uma surra do vilão e tenha que passar um tempo se recuperando isto já é prova suficiente do amadurecimento mental (seja isto o que for) dessa platéia.

Nolan fez na sua trilogia uma espécie de compressão temática de tudo que compõe a mitologia Batman, utilizando um bom elenco fixo, e atraindo participações memoráveis. Um bilionário recluso, cercado por uma equipe high-tech de fazer inveja à de James Bond, decide combater o crime em sua cidade, em parte por motivos freudianos (a morte dos pais, o medo de morcegos).  As contradições e os desvãos escusos dessa decisão arrogantemente individual são explorados nestes três filmes, em que Batman deixa de ser um “cruzado de capuz” acima do Bem e do Mal. Ele se torna um livre atirador numa briga pesada que envolve a polícia, os gênios-do-mal e os pequenos transtornos (como a Mulher Gato) que se atravessam na sua frente.  E isto deixa mais visíveis as suas contradições como agente da lei. Bandido rico, bandido bem armado, mas bandido.

Batman é rico, é impaciente com a incompetência do Estado, e resolve criar um Estado-de-um-homem-só para salvar seus conterrâneos. O vigilantismo dessa atitude o deixou permanentemente em xeque. Ele não é um cruzado. É um bilionário que quer fazer administrar o mundo pelos seus próprios critérios.

O sucesso dos filmes mais recentes de Super-Heróis reflete dois processos.  Por um lado, o mundo real está ficando mais carnavalizado, mais decorativo, mais quadrinhesco; pessoas de 50 anos ficariam perplexas com o modo como nos vestimos, nos adornamos. Por outro lado, esse comércio forçado entre os dois mundos faz com que alguns heróis comecem a perder a invulnerabilidade infantil de sua fase “gibi” e passem a se contaminar de mundo real. Foi a novela gráfica de Frank Miller, “The Dark Knight Returns” (1986), que iniciou este processo. Agora, com os blockbusters do cinema, ele chega a um público maior. É uma lenta pororoca entre as mitologias e fantasias que criamos a respeito de nós mesmos, e o modo como elas deixam de ser fantasias consolatórias para serem fantasias neuróticas em que toda a energia do problema original ressurge intacta e resiste até à bomba atômica.

Um comentário:

Vinicius A. Amaral disse...

Achei muito interessante o modo como você termina essa crônica: o mundo irreal dos gibis está mais plausível que o mundo real.
Talvez essa lenta inversão tenha atiçado mais a esquizofrenia das pessoas: tudo não passa de um game ou de um sonho, coisas do tipo.
Enfim, só uma observação.