sexta-feira, 19 de fevereiro de 2010

1674) Antropologia do celular (24.7.2008)



Jan Chipchase é um londrino de 38 anos, formado em Economia, que mora atualmente no Japão e trabalha para a Nokia, fazendo um trabalho que a imprensa chama de “antropologia das corporações”, mas que ele, por não ser propriamente um antropólogo, prefere chamar de “pesquisa de design”. Basicamente, o que ele faz é viajar pelo mundo estudando as novas maneiras de utilizar os telefones celulares.

Já falei aqui que a tal “Revolução do Microcomputador” é coisa do passado. Sou da geração que quando viu um computador (CPU + monitor + teclado + impressora) em cima de uma mesa, para ser usado apenas por mim, me ajoelhei no chão erguendo e abaixando os braços, e salmodiando: “Caramuru!... Caramuru!...” Não parecia haver milagre maior. O milagre maior veio logo depois, quando vi o primeiro notebook – um computador inteiro (OK, menos a impressora!) do tamanho de um livro. OK, não qualquer livro – do tamanho do meu exemplar da Beatles Anthology. Mas era outro deslumbramento.

Mal sabia eu que a próxima virada de esquina nos traria o Grande Milagre atual: o celular. Concebido para ser apenas um telefone portátil, virou uma maquininha multiuso que inclui telefone, câmera fotográfica, filmadora, agenda eletrônica, calculadora, processador de texto, acessador de Internet... Onde iremos parar?

Jan Chipchase diz que o público usuário de celular se expande em todas as direções. Há populações analfabetas aprendendo a usá-lo, e a Nokia está desenvolvendo modelos que facilitam o uso a quem não sabe ler, embora tais modelos não sejam “marquetados” dessa forma, para não criar um estigma e afastar os usuários. Na África é comum um único aparelho servir para uma família inteira, e foi desenvolvido um sistema que permite esse aparelho guardar várias identidades, cada qual com sua agenda telefônica, mantendo a privacidade de cada usuário.

Em Uganda, diz Jan, o celular serve à população pobre como um meio de transferência de dinheiro. Digamos que Fulano está na capital e precisa transferir 50 dólares para sua irmã, que mora num vilarejo onde não há bancos. Ele vai no shopping, compra 50 dólares em crédito num cartão pré-pago, e liga para o cara que mantém no vilarejo um quiosque de celulares pré-pagos para uso da população. Ele informa ao cara o número do cartão pré-pago, o cara carrega o valor num dos seus celulares, e entrega 50 dólares à irmã do outro.

Em comunidades pobres onde não existem luxos como nome de rua e número de casa, diz ele, é comum as pessoas escreverem sobre a porta de entrada o número de seus celulares, o qual passa a ser o segundo meio mais importante de identificação, depois do nome próprio. Diz Jan (cujo blog, aliás, fica em: http://www.janchipchase.com/): “Qualquer interferência pirata para melhorar o uso prático de um celular, criada em qualquer parte do mundo na segunda-feira, na sexta-feira já estará sendo aplicada nas ruas de Gana”. Ou de Campina.

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