sábado, 2 de janeiro de 2010

1465) Brasil 2x1 Uruguai (23.11.2007)


Ainda estou com os dedos trêmulos pela adrenalina desse jogo, encerrado há mais de uma hora. Diante do Morumbi lotado, o país inteiro esperava aquilo que os ufanistas tipo Galvão Bueno chamam arrogantemente de “uma exibição de gala” da Seleção. Bastou a bola rolar para percebermos que, mais uma vez, a Seleção também esperava a mesmíssima coisa. Estava pronta para dar uma exibição de gala: fintas elegantes, passes de calcanhar, passes de trivela, lençóis, dribles-da-vaca, confortáveis matadas no peito com os zagueiros respeitosamente à distância... E (mais uma vez) nada disso pôde acontecer, porque o adversário (esse eterno desmancha-prazeres das nossas exibições de gala!) não concordou.

O Brasil tem um grande futebol, mas só terá o Maior Futebol do Mundo no dia em que eliminarem do esporte esta permanente fonte de irritação: o Adversário. O adversário que nem quer saber para que lado Ronaldinho Gaúcho olha: ele fecha em cima, toma a bola, e acelera pro contra-ataque. O adversário que não espera a pedalada de Robinho: dá um bico pra lateral. O adversário que não deixa Kaká dar as suas arrancadas: vai em cima na base do encontrão, manda Kaká pro alto e a bola lá pra frente.

Os uruguaios pareciam estar jogando dopados, tamanho o ímpeto com que disputaram cada palmo de terra durante os 90 minutos. Quem sabe o “doping” deles se chame “estádio repleto de brasileiros gritando”. Rudes, broncos, truculentos como sempre são; mas infatigáveis, velozes, e acima de tudo possuídos por uma enorme vontade de ganhar o jogo, enquanto que o Brasil parecia apenas com vontade de dar uma “exibição de gala”. Encurralaram a Seleção, ganharam todas as divididas, partiram céleres para o ataque a cada roubada de bola, e só não ganharam (o que teria sido um resultado justo) porque perderam gols feitos, Julio César espalmou tudo, Luís Fabiano encaçapou com firmeza duas bolas difíceis – e porque a Seleção Brasileira tem um time muito superior. Mesmo deixando as chuteiras no vestiário e pisando a grama de “escarpins”, mesmo pensando em pedaladas e dribles de letra, nosso time é muito melhor que o do Uruguai, e bem ou mal acabou ganhando.

Ah, amigos, as obras de arte que nossos jogadores criarão um dia, quando o futebol eliminar esse contratempo – o Adversário! Seremos como aquele time do basquete americano, os Harlem Globetrotters, que viajam pelo mundo exibindo um repertório fabuloso de habilidades. O futebol deixará de ser um esporte, uma disputa, e se transformará em pura Arte, pura estética de balé atlético, coreografias, malabarismos. Ninguém para passar o sarrafo, ninguém para meter o cotovelo ou o ombro, ninguém para disputar encarniçadamente uma bola boba da intermediária como se daquela única jogada dependesse o fim do mundo. Nossos jogadores têm genialidade. Vê-los jogando é como ouvir uma Fuga de Bach. Agora, aqui pra nós – pelo menos no jogo de hoje, o Uruguai teve muito mais rock-and-roll.

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