segunda-feira, 22 de junho de 2009

1113) A Macaca Tioa (8.10.2006)



Quando eu vi que Paulo Maluf teve 700 mil votos e foi o deputado mais votado do Brasil, cambaleei. Pensei: “O Brasil é um filme de Coppola, onde quadrilhas de mafiosos vivem se exterminando umas às outras mas há sempre uma delas no poder”. Depois vi que Fernando Collor teve 500 mil votos e agora vai atacar o Legislativo. Corrigi-me: “Não! O Brasil é um filme de vampiros, dirigido por Terence Fisher, em que criaturas sobrenaturais vêm sugar nosso sangue e não tem estaca-no-coração capaz de dar cabo delas”. Aí fiquei sabendo que o costureiro Clodovil teve 500 mil votos, e relaxei. Deixa pra lá. O Brasil é um filme do Casseta & Planeta, e é melhor a gente ir cuidar de outra coisa.

Quando digo cuidar de outra coisa não me refiro a deixar o Brasil entregue aos tais políticos. A “outra coisa” de que devemos cuidar é o País, que é sempre feito pelo Povo, com a eventual colaboração (ou a freqüente sabotagem) dos funcionários públicos que esse mesmo povo elege para os Três Poderes. Se Maluf, Collor e Clodovil estão no outro prato da balança, mais uma razão para que a gente se mobilize: para equilibrar o placar.

Clodovil criou de propósito a imagem de um sujeito esnobe e de nariz torcido para todos. Tem sempre aquela atitude de “antes que você me despreze, eu desprezo você”. Uma vez, na TV Manchete, recebeu Dominguinhos, que ia apresentar seu novo disco. Ele anunciou, sem sequer cumprimentar o entrevistado na poltrona ao lado: “Bom, agora vamos falar do disco do sanfoneiro Dominguinhos, que está aqui com a gente”. Olhou o LP de um lado, do outro, e perguntou: “É seu primeiro disco?...” Dominguinhos, com aquele sorriso calmo de Confúcio sertanejo, respondeu: “No Brasil, é o décimo-quarto”.

O brasileiro já votou no rinoceronte Cacareco, no “Bode Cheiroso” de Jaboatão, e no Macaco Tião do zoológico do Rio. Clodovil emergiu das urnas como o Macaco Tião paulistano -- ou, com todo respeito, a Macaca Tioa. Dizem que quem elegeu Clodovil foi o voto gay. Será que os gays de São Paulo pensam que Clodovil na tribuna vai defender projetos de lei relativos a tratamento da Aids, à união conjugal de pessoas do mesmo sexo, e outras causas que lhes interessam? Podem ter essa esperança, porque um parlamentar não-homossexual (ou pelo menos que não o seja publicamente) fica sempre meio cauteloso para defender esse tipo de causa. A questão é: um sujeito como Clodovil é capaz de defender algo pelo mero senso de dever ou de solidariedade, sem obter nenhuma vantagem pessoal na transação?

Mas, já que não tem mais jeito, vamos relaxar e assistir. Vai ser um espetáculo felliniano. E se pode um destrambelhado mental como Enéas, por que não pode Clodovil? Se pode um cleptomaníaco eufórico como Maluf, por que não pode Clodovil? Se pode o deputado Hildebrando, que mandava matar com motosserra os inimigos, por que não pode Clodovil? Já estou imaginando um cordel: “A Condessa Descalça Entra no Instituto Butantã”.

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