quinta-feira, 18 de dezembro de 2008

0673) Adeus às armas (15.5.2005)


(Carlos Ranna)

A campanha pelo desarmamento doméstico está de novo na imprensa, em vista do tal referendo que deverá acontecer ainda este ano, no qual a população dirá se a produção e venda de armas deve ou não ser proibida. É sempre delicado você chegar de uma hora para outra e, com uma canetada, colocar fora da lei centenas de empresas que fabricam e comercializam algum produto. Cria um problema social, vai desempregar muita gente, etc. Só vale a pena se for para um fim muito nobre, e num assunto de muita urgência. É este o caso?

Alguns defensores da tese “População armada é população segura” argumentam que um sujeito com uma arma em casa pode defender sua família melhor do que um sujeito desarmado. Discrepo, nobres colegas. Prefiro viver num país onde se desarmam os bandidos do que num país onde se armam os cidadãos. Me sinto meio inseguro no Rio de Janeiro, mas não me sentiria melhor se andasse com um 38 na cintura. Ia acabar fazendo “disparos preventivos” à la George W. Bush. Vocês já empunharam um revólver? É um design impressionante, aquilo se encaixa tão bem na mão da gente que apertar o gatilho parece uma coisa inevitável, obrigatória. Se não apertar, a gente fica se sentindo meio incompleto.

Robert Heinlein, um escritor que admiro mesmo discordando, era um fervoroso defensor (como toda a Direita norte-americana) da tese do “cidadão armado, cidadão livre”. Esta Direita Liberal desconfia profundamente do Estado, acha que o Estado quer apenas oprimir e sacanear o cidadão, e que se o cidadão ceder seu fuzil ao Estado estará se entregando de mão beijada ao inimigo. Heinlein afirmava que o direito de portar armas era a base de toda a liberdade humana. “Sou contra qualquer tentativa de licenciamento ou restrição ao porte de armas por parte de um indivíduo”, dizia ele. “A França tinha esse tipo de leis. Quando os nazistas a invadiram, tudo que precisaram fazer foi consultar os livros de registro nas delegacias locais e apreender todas as armas dos franceses.”

Direitistas como Heinlein ou Charlton Heston julgam viver numa selva onde a qualquer instante seremos assaltados por traficantes ou invadidos por nazistas, e é preciso estar atento e forte, com um AR-15 na parede da sala e um parabelo na mão. Se você sugerir a ele que a melhor solução seria eliminar o tráfico e impedir o surgimento do nazismo, ele dirá que não, “deixa que eles venham, que eles vão ver o que é bom pra tosse”. É uma cultura da agressividade que precisa desesperadamente de ameaças para ter a chance de usar suas armas “por uma boa causa”.

O erro dos atuais governos é que não estão conseguindo desarmar os traficantes, bloquear o contrabando de armas para o país, neutralizar a indústria do crime (seqüestros, assaltos a carretas, etc.). Estão tentando fazer algo que, mesmo difícil, ainda é a parte mais fácil: desarmar os cidadãos. Seu erro não é fazer o que está fazendo, é continuar a não fazer o que nunca fez.

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