quinta-feira, 20 de agosto de 2015

3898) Tem mas acabou (21.8.2015)




Quem nunca passou por isso num restaurante, num café, ou mesmo em outros tipos de loja?  

Você senta, pede o cardápio, vai passando os olhos, aí descobre algo como: “Sanduíche Montparnasse: baguete crocante com gergelim, fiambre, queijo minas, bacon pulverizado, gomos de tangerina, molho mostarda-e-mel”. 

Você se anima. Aquilo pode até ser indigesto mas pelo menos é diferente; você chama o garçom e pede. Ele olha o cardápio e diz: “Esse aí tem, mas acabou”.

Todo mundo se irrita com essa resposta, mas ela me parece totalmente lógica. O cara está dizendo que sim, de fato, o sanduíche faz parte das atrações da casa. É produzido regularmente ali, recebe pedidos, vende unidades. Ou seja: tem. Acontece que naquele momento acabou, em geral porque se esgotaram alguns ingredientes principais. 

O formato da resposta parece contraditório, mas ela está dizendo apenas: “De fato temos esse sanduíche no cardápio, pode voltar a pedir noutro dia; mas agora não estamos servindo porque acabou o molho de açafrão-pimenta (ou seja lá o que tiver acabado)”.

Se o garçom disser “Não tem” (advertem os especialistas em vendas), está subliminarmente induzindo na mente do freguês a noção de que o produto não tem MESMO, não está à venda, não vale a pena pedir de novo. É o anti-marketing. 

É preciso transmitir ao cliente uma mensagem positiva que o console da frustração momentânea. É preciso fazer com que o cliente não bata em retirada, pelo contrário: volte daí a alguns dias, convencido de que ocorreu apenas uma turbulência momentânea mas ele vive num Universo onde as coisas fazem sentido, e coisas que pareciam ter acabado para sempre acabam é voltando.

O “tem mas acabou” é uma fórmula de teimosia positiva. É o mantra cheio de estoicismo de alguém que mesmo derrotado não dá o braço a torcer, de alguém mantendo viva a chama da esperança de que num dia mais favorável aquele cliente e o seu sonhado sanduíche possam finalmente se encontrar numa lua-de-mel de dentadas, salivas e degustações. 

É um gesto de altivez na derrota, é como o artilheiro de um time que, atravessando um jejum de meses sem marcar um gol, ainda é capaz de dizer no fim de mais um jogo, ao microfone dos repórteres de campo: “Não teve gol, mas domingo vai ter jogo de novo, quem sabe se o gol não vai sair?”.

O “tem mas acabou”, portanto, é implicitamente seguido pela sua formulação inversa e otimista: “Acabou, mas tem”. Vai ter. Pode voltar. Não é o fim do mundo ainda. A frase reafirma (ainda bem, humanidade!) aquela cega confiança de que vale a pena continuar tentando, pois nenhum vazio é eterno e nenhum fracasso é definitivo.





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