(Oscarito)
Para um crítico ou historiador das artes narrativas existe
sempre uma pergunta que pode ser aplicada a qualquer tipo de criação: Quem foi
o primeiro que fez isto? O crítico sabe
que um filme ou um livro é apenas um fotograma (rico de informações, é claro)
de um filme mais longo, onde aquela idéia sofrerá suas próximas e sucessivas
mutações. Aquela obra é o instantâneo atual daquela idéia. Mas o espectador
(leitor, fã, etc.) tem uma pergunta diferente, quando ele pensa em todas as
histórias que já foram contadas. Ele
pensa: Onde foi que eu vi isso pela primeira vez, e minha alma nasceu, ou
nasceu de novo?
Leitores muitas vezes têm suas epifanias mal acompanhados.
Quando ele lê uma das grandes cenas da literatura, que encanta a humanidade há
milênios, vai ler numa versão contemporânea, mal traduzida ainda por cima, mas
vai ser uma epifania do mesmo jeito. A primeira vez em que li sobre o jardim
das veredas que se bifurcam foi num romance de F. Richard-Bessière aos dez
anos. Fiquei pronto para conceber o espaçotempo como os fios de uma tapeçaria
que não enxergamos por inteiro. Sabemos apenas que nosso fio vai em tal e tal
direção, muda de cor aqui e ali, e que se isso não acontecesse o desenho final
ficaria maculado ou incompleto.
Onde foi que eu vi minha primeira máquina do tempo? Foi no filme de George Pal, e sem ele eu não
teria ido atrás de um escritor chamado Wells, que eu na verdade pensava ser um
ator de cinema que tinha inventado uma invasão de discos voadores num programa
de rádio. Qual foi a primeira vez em que
eu vi uma mulher nua no cinema? Acho que foi uma vez no cine São José de
Campina Grande (que está em processo de restauração, salvou-se uma alma!). Eu
tinha uns nove ou dez anos. Tia Adiza me
levou, como fazia quando era à noite, para ver uma chanchada qualquer com
Oscarito, Zé Trindade, Ankito... aquela turma. Antes do filme, entrou um
trailer onde aparecia (em preto e branco, anos 1950) uma dançarina usando o que
uma rainha de bateria de Escola de Samba usa em 2015. Um cronoclasma, na terminologia de John
Wyndham.
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