sexta-feira, 11 de abril de 2014

3470) "True Detective" (11.4.2014)




(Marty Hart e Rust Cohle)

A série True Detective, encerrada recentemente na TV a cabo, conta a investigação de crimes seriais na Louisiana, envolvendo elementos ritualísticos e satânicos. Os protagonistas são dois detetives, Marty Hart, um pai de família convencional, que convencionalmente trai a mulher a-dar-com-o-pau, e Rust Cohle, um semi-junkie niilista com fascinação por crimes rituais.  A história total abrange 17 anos da vida dos personagens e pode ser resumida assim: Hart e Cohle investigam os crimes, descobrem o criminoso, mas não se contentam e querem investigar mais, pois suspeitam de uma rede muito maior de fanáticos que sacrificam crianças e mulheres. A rivalidade mútua os leva a brigar, e Cohle larga a polícia. Muitos anos depois, crimes parecidos são descobertos, e dois novos policiais interrogam Hart e Cohle (os dois já enormemente mudados) para saber os detalhes da história, e solucionar a dúvida principal: se o criminoso foi apanhado anos atrás, como se explica que crimes idênticos tenham voltado a acontecer?

Hart (Woody Harrelson) é um daqueles policiais-modelo de um milhão de filmes, caras durões, sem frescura, sem teorias, interpretados por Richard Widmark ou Kirk Douglas. Rust Cohle (Matthew McConaughey) é de outra natureza. Um sujeito calejado, atormentado, que diz ter perdido a filhinha pequena anos atrás (não dá detalhes), e por isso torna-se obcecado por matadores de crianças (um pouco como o Fox Mulder de Arquivo X, que julga ter tido a irmã abduzida por alienígenas). O duplo arco narrativo (passado e presente) converge para uma situação em que dois ou três desfechos são plausíveis. Um deles acontece. Gente reclamou que era previsível. Eu achei que ia dar outro; mas acabei preferindo que terminasse como terminou. O final que eu imaginei seria cruel demais.

Louisiana é um estado anômalo nos EUA, com influência francesa, caribenha, negra, tudo misturado. É a pátria dos vampiros e bruxas de Anne Rice, e locação de muitas histórias de vudu e feitiçaria. Curiosamente, há poucos negros em True Detective.  O satanismo que campeia naquelas quebradas escondidas no mato é um satanismo do “white trash”, o lixo-humano branco, geneticamente deformado por séculos de semi-incesto dos miseráveis, misturado à mentalidade sádica e torturadora dos lordes escravagistas.  E instituído por uma organização que envolve xerifes, políticos, pastores evangélicos; é “o lado tenebroso da Força”, o retrato-de-dorian-gray onde se acumulam todos os crimes e pecados de uma América que se exibe ao mundo limpa, imaculada, conservadora e cristã.  Quem sabe o mal que se oculta no coração dos homens?  Rust Cohle sabe.


2 comentários:

Vinícius Goularte disse...

Como seria o final que você imaginou?

Jean disse...

Vi a série, pra mim a melhor desde Breaking Bad. Lembrei um pouco do gótico sulista de Flannery O´Connor e William Faulkner. A Louisiana parece um pedaço do Caribe nos EUA.