Volta à imprensa e às redes sociais a discussão sobre erros
de tradutores, em função de alguns livros recentes. Como passo 4 ou 5 horas por
dia amarrando esse tipo de pingo dágua, me conforta perceber que não sou o
único que erra, que erros podem ser perdoados, e que o mundo não se acaba
quando a gente paga um mico.
Cito um post no Facebook da tradutora Denise Bottmann, figura
exigente e respeitada na profissão: “A gente erra: seja o erro de ler errado,
por distração, seja o erro de não saber direito o sentido e trocar alhos por
bugalhos, seja o erro qualquer erro, errado em suma. Nenhum leitor
deveria, sugestão minha, esperar uma plena reconstituição / restituição /
recriação etc. do original, claro, mas tampouco esperar algo prístino,
imaculado, impecável. A gente erra. Não de vez em quando, uma vez a cada morte
de papa. Não, erra sempre, o tempo todo, seja aquela coisa mais crassa, idiota
mesmo, seja aquela distração imperdoável, seja aquela simplificação grosseira
ou qualquer outra coisa”.
Entre os resenhadores da imprensa, virou um hábito escolher
o pior erro do tradutor para denunciar em público. (Poucas vezes vejo um
resenhador abrir um parágrafo só para destacar um grande acerto, uma solução
feliz encontrada pelo tradutor.) O desprestígio da profissão conduz a um
círculo vicioso. Os erros se multiplicam graças à presença de centenas de
pessoas mal preparadas, verdes, que traduzem porque precisam de dinheiro ou
porque “moraram dois anos nos EUA e sabem inglês”. Alguns desses até poderiam
virar bons tradutores, com o tempo, mas foram ridicularizados num caderno
literário e desistiram. (Conheço casos.)
Um tradutor não é uma pessoa “que sabe inglês” (ou o que for).
É um escritor. Quem não é escritor, jamais traduzirá. Escritor (tradutor) de
literatura, de humanidades, de livros técnicos, de filosofia, de poesia: cada
ofício destes exige talentos diferenciados. E sempre sabendo que o que estamos
produzindo não é, nunca, um equivalente perfeito do original. A tradução é um
jogo onde se perde o tempo todo, onde é proibido ganhar, e onde o teto possível
é o empate.
2 comentários:
Adorei o seu post, Braulio. Temos que nos lembrar mais vezes que somos humanos e erraremos; não como uma justificativa para o erro, mas uma constatação da nossa natureza e só. Podemos trabalhar duro para tentarmos alcançar a perfeição, com a consciência de que poderemos errar e aprender com o erro.
Excelente, Braulio! Obrigada.
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