quinta-feira, 5 de setembro de 2013

3284) Carlos Fernando (6.9.2013)




(Carlos Fernando, no carnaval do Recife)

Meu último encontro com Carlos Fernando foi em 2009, no Recife, no aniversário de Aluísio Maluf, numa roda de violão que entrou pela madrugada, todo mundo tocando sambas e forrós puxados do fundo do baú, e Alceu Valença regendo a roda num coral cantando “Pressentimento” de Elton Medeiros: “Ai, ardido peito, quem irá entender o teu segredo?...” Foi uma bela noite de farra, e Carlinhos, com sua voz rouca e olhar encatitado, ficava entre uma música e outra, de dedo em riste, verbalizando manifestos estéticos em favor de um determinado ritmo ou esculhambando com a falta de memória do país, “ninguém conhece mais uma música linda como essa!”.

Carlos Fernando é o autor de “Banho de Cheiro”, gravado por Elba Ramalho (“Eu quero um banho de cheiro, eu quero um banho de lua, eu quero navegar...”), um dos seus sucessos que tocaram mais insistentemente nos últimos trinta anos. Compôs algumas das canções mais lindas de Pernambuco, em parceria, principalmente, com Geraldo Azevedo e Alceu. Mas foi, acima de tudo, um defensor do frevo, não somente o frevo como música instrumental para se fazer o passo nas ruas e nos bailes durante o Carnaval, mas o frevo como um dos gêneros atemporais, não-sazonais, da Música Popular Brasileira.

Acho que foi Capiba quem disse uma vez que o frevo poderia ser algo como o jazz, um tipo de música vibrante, complexo, envolvente, que poderia ser composto, tocado e dançado no mundo inteiro, independentemente de nacionalidade ou época. Carlos Fernando não tinha uma formação musical complexa – na verdade, era mais letrista, embora tivesse um senso melódico muito apurado. Seu frevo não era o frevo instrumental das orquestras, era o frevo de canções com letra, no modelo de Capiba e Nelson Ferreira. O seu projeto Asas da América (1979-1999) foi uma das maiores iniciativas de um só artista em defesa de um gênero que já houve na MPB. Compondo, produzindo, escolhendo cantores e arranjadores, Carlinhos botou Chico Buarque, As Frenéticas, Alcione, Jackson do Pandeiro + Gilberto Gil, Caetano Veloso, para cantar frevo. Gravou Tadeu Mathias, Terezinha de Jesus, Lenine & Lula Queiroga (talvez a primeira gravação conjunta dos dois), Flaviola e outros artistas nordestinos que surgiam na época.

Carlos Fernando faleceu semana passada, no Recife, aos 75 anos. Seu último trabalho, acho, foi a compilação 100 Anos de Frevo – É de Perder o Sapato, um CD duplo de 2007. Precisando checar alguns nomes e datas, procurei um verbete sobre ele na Wikipédia: não existe. Quem nos salva são os estrangeiros. Visitem este saite em espanhol, as Asas estão todas lá: http://bit.ly/17vsyRX. 


Um comentário:

Flávio disse...

mais um artista que eu gosto,que se vai.agora eu pergunto...o povo conhece o Carlos Fernando?as canções sim.eu mesmo não sabia que ele existia, até ver num encarte de um cd de Elba,quem era o compositor da música que você citou.mas a maioria das pessoas não tem essa curiosidade.