sábado, 30 de junho de 2012

2910) Hora do recreio (30.6.2012)







(esculturas: William Bally, 1831)


A pior aula é a de matemática, pra não falar da de geografia, se bem que a unanimidade é a de desenho. O engraçado é que cada um de nós, mesmo detestando todas, detesta mais uma do que as outras. Às vezes discutimos tanto isto que perdemos minutos preciosos em que poderíamos brincar no pátio, jogar bola na quadra ou no ginásio, zoar na lanchonete. Vida de aluno interno é todo dia a mesma coisa, a mesma coisa, é de enlouquecer. Ainda sirenes tocando toda noite. Um de nós disse um dia, “nós somos um loop de imagens, eu tenho a impressão que todo dia eu digo isso de novo”, e rimos, e depois outro disse, “não, eu acho que nossos pais nos botaram aqui pra se ver livres de nós, eles têm a esperança que a gente se suicide”, e rimos, e outro disse, “nós não somos estudantes, somos espiões estrangeiros, e na verdade estamos num campo de concentração, eles nos deram uma droga pra gente pensar que tem 10 anos de idade e está no colégio”, e houve uma risadaria geral, na mesma hora cada um de nós pegou uma arma, uma régua (metralhadora), uma bola-de-papel (granada), e começamos a guerra, “morre, espião!”. Estamos em guerra (as explosões, os sinos). Nossos pais, na visita semanal, nos dizem que apesar do sofrimento e das baixas estamos ganhando, mas as despesas estão cada vez maiores e é melhor continuarmos aqui do que ir lá para fora. Sobem nuvens grossas de fumaça preta. Temos mais raiva da guerra do que das aulas. O bom mesmo são os recreios: uma vez na manhã, outra depois do almoço, outra no meio da tarde. É tanta coisa boa que ficamos ansiosos porque não podemos ter tudo ao mesmo tempo, os snacks e os refris da lanchonete, o corredor de fliperamas, as armas do play, os wargames do lan-room, e nós nos empurramos, nos acotovelamos, brigamos por uma cadeira, por um monitor, por uma bola, por uma posição no time. Se fosse só isso! Mas temos as aulas, a obrigação de estudar história, ética pública, bases constitucionais, metodologia das ciências, “para quando houver paz”, bradam os professores. Um dia um de nós quis saber por que motivo não havia meninas no colégio, e alguém disse, “porque eles estão nos treinando para ser homossexuais”, e nós rimos, e outro disse, “não, porque eles vão nos mandar para morrer na guerra e deixar a população com um homem para cada dez mulheres”, e todo mundo achou graça. Oba! Recreio de novo. Não está chovendo mas nos mandaram para o ginásio, nunca vimos o ginásio tão cheio, tão apertado, a gente mal consegue respirar, ainda bem que daqueles tubos lá no alto estão saindo jatos de vapor, estamos pensando agora que deve ser alguma coisa para que a gente consiga respirar melhor.

Um comentário:

Ana Ribeiro disse...

O que seria mesmo essa tal realidade?
Abraço.