sábado, 28 de maio de 2011
2568) A arte da subitização (28.5.2011)
A gente mostra uma foto dos Beatles a um sujeito que nunca ouviu falar deles e pergunta: “Quantas pessoas tem aí?”. O cara olha e responde em um segundo: “Quatro”. Mas se a gente mostrar uma foto de uma orquestra sinfônica e fizer a mesma pergunta, ele vai ter que sair contando: “Um... dois... três...”, até chegar ao total. O que ele fez no primeiro caso foi o que os psicólogos chamam de subitização: saber instantaneamente a quantidade de elementos de um conjunto sem ter de contá-los um a um. Dizem que o limiar médio do ser humano é quatro, e que à medida que essa quantidade vai aumentando, aumenta também a nossa dificuldade de “enxergar” o total, sendo preciso fazer a contagem.
Em seu conto “Funes, o Memorioso”, Borges tem uma visão hiperbólica do que seria essa função mental num homem dotado de memória absoluta. Diz ele: “Nós, de uma olhadela, percebemos três copos em cima de uma mesa; Funes percebia todos os rebentos e cachos e frutos que comporia uma parreira”. No filme Rain Man, há uma cena em que alguém derrama uma caixa de palitos no chão e o autista interpretado por Dustin Hoffmann percebe de uma só olhada que são 246.
A palavra significa “apreensão súbita ou imediata”. Muitas pessoas desenvolvem a capacidade de fazer tais cálculos através do processo chamado de “agrupamento e contagem”. Por exemplo, se mostramos uma foto com nove pessoas amontoadas ao acaso é mais difícil perceber quantas são do que se elas estiverem divididas em três grupos com três pessoas cada um. Neste último caso, bastam duas subitizações rápidas e sucessivas para sabermos que cada grupo tem três, e que o total é de nove.
Dizem que quando Henry Thoreau trabalhava numa fábrica de lápis ele sempre identificava a quantidade exata de lápis numa caixa sem contá-los. Já vi um depoimento de que algumas pessoas eram capazes de contar 38 ovelhas num rebanho, com uma só olhada à distância. Beremiz Samir, o personagem de O Homem que Calculava de Malba Tahan, levava essa capacidade a extremos surrealistas. Ao ver uma cáfila de camelos e ser perguntado quantos eram, ele dizia algo como: “São 484... Perdão, são 121, eu tinha contado as pernas deles”.
O hábito de contar folhetos de cordel me fez desenvolver um método de subitização baseado no número cinco. Quando a gente tem que saber o total de uma pilha com centenas de folhetos é mais fácil sair pegando de cinco em cinco (o olho calcula e o dedo separa num segundo), e ir contando: “1, 2, 3, 4, 5, 6....” No final basta multiplicar por cinco o total.
Um exemplo curioso diz respeito à capacidade de contar dos corvos (aves mais inteligentes do que a média). Três caçadores entram num local fechado, dois saem; os corvos olham e ficam à distância. Quatro entram, três saem: idem. O limite dos corvos é alcançado quando entram seis caçadores e saem cinco; os corvos pensam que o local está vazio e voam até lá. O limite de sua capacidade de subitização (ou de contagem) é cinco.
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