domingo, 3 de janeiro de 2010

1468) A embriaguez do poder (27.11.2007)


(o Presidente da República, Prof. Dr. Braulio Tavares)

Ninguém se horroriza mais do que eu com as denúncias da imprensa sobre as mordomias do Governo Federal. O Globo tem publicado matérias sobre o inchaço dos gastos dos Poderes da República. São despesas alucinadas em todas as direções. Em alguns casos, gasta-se em excesso (paga-se uma fortuna por algo que é muito mais barato). Em outros, gasta-se mal (compra-se o produto errado, ou contrata-se um serviço desnecessário). Em outros ainda gasta-se de modo absurdo (são as despesas inexplicáveis, que não se explicam pelo perdularismo, pela desonestidade ou pela incompetência).

Me horrorizo agora, porque sou da imprensa. Mas quando eu fôr eleito Presidente da República provavelmente farei a mesma coisa. Minha primeira medida será mudar os horários de todas as repartições federais, cujas 8 horas regulamentares de trabalho passarão a ocorrer das 14 às 18:00 (primeiro expediente) e das 19 às 23:00 (segundo expediente). Vão ter que trabalhar na hora em que eu trabalho (e olhe que eu também trabalho de madrugada; estou sendo até bonzinho).

Sou um sujeito ascético e não esperem de mim essas mordomias tradicionais dos políticos: champanha, caviar, etc. Minhas mordomias serão culturais. Criarei, com orçamento equivalente ao atual Ministério da Cultura, o Ministério da Cantoria de Viola. (Não revelo agora quem será meu Ministro para não despertar ciúmes entre os amigos) Criarei o Ministério da Ficção Científica, ao qual ficará vinculada a Secretaria de Assuntos Estratégicos. Darei atenção especial à valorização do nosso Patrimônio Histórico, e ordenarei o tombamento do Treze Futebol Clube como patrimônio imaterial do povo brasileiro. (Em contrapartida, exigirei minha nomeação para o Departamento de Futebol do dito cujo, com poderes para mexer na contratação de reforços e na escalação do time.)

Enfim – o que quero sugerir, com esta modesta “reductio ad absurdum”, é que as mordomias em que Nossos Guias incorrem não são adotadas com o objetivo explícito do achincalhe, do deboche, da provocação. Na maioria dos casos o governante acredita, com certa sinceridade, estar fazendo algo necessário, algo importante. Tenta promover aquelas área que historicamente lhe são próximas, e sobre as quais acredita ter algum tipo de conhecimento e de controle. O problema é que sua avaliação está comprometida pela embriaguez do cargo. Escrevi uma vez: “Dizem que o poder corrompe, mas digo eu que o poder cega, o poder embaça todo o resto além do eu”. O ex-presidente FHC disse certa vez que a coisa que mais estranhou depois de deixar a Presidência foi pegar em maçanetas: “Passei oito anos sem abrir sequer uma porta de carro, alguém sempre ia à frente e abria para mim”. O poder é uma espécie de Big Brother maquiavélico a que o Sistema expõe um esquerdista, um sociólogo, um operário – para fazê-lo pagar esse mico histórico diante da Nação, mostrar o quanto qualquer um de nós é humano, constrangedoramente humano.

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