Uma das lições literárias mais inspiradoras que já recebi me foi dada involuntariamente (como aliás ocorre com a maioria das Grandes Lições), e por um guri de 5 anos. Era época pré-natalina e eu estava conversando com um casal de amigos na praça de alimentação de um shopping. (Na verdade não foi bem assim, mas se eu disser onde era ninguém vai acreditar, então vamos em frente com uma ficção plausível.) Aí chegou o garoto deles todo excitado: “Pai! Mãe! Acabei de conversar com Papai Noel!” Eu estava numa veia implicante e disse ao meu amigo: “Mas Fulano, você ainda não explicou a seu filho que Papai Noel não existe?!” O pirralho me fitou de cima a baixo com soberano desprezo e falou: “Claro que existe. Ele falou comigo, eu sentei no colo dele, ganhei um chocolate, puxei a barba dele...” Aí fez uma cara de conspirador, pôs a mão juntinho da boca e sussurrou: “É falsa!”
Um garoto de cinco anos entende melhor o que é ficção do que qualquer marmanjo de cinqüenta. De fato, como você vai dizer que o sujeito não existe, se em dezembro as ruas e as lojas estão cheias dele?! É o mesmo que se dá com o príncipe Hamlet, da Dinamarca. Se pudéssemos reunir todos os indivíduos que já usaram seu nome, vestiram suas roupas e disseram suas falas, encheríamos vários Maracanãs. Alguém tem a coragem de dizer que Hamlet não existe? Existe mais do que eu ou você, caro leitor, que se desaparecermos amanhã a Humanidade nem toma conhecimento. Mas desapareça Papai Noel, e você vai sentir o abalo no PIB.
Papai Noel e Hamlet podem não ter uma existência individual como a minha e a sua, mas a existência que têm é de causar inveja a qualquer um de nós. Para começo de conversa, são imortais, porque quando um ator morre o personagem continua. Depois, são ubíquos, podem estar em várias partes do mundo na mesmíssima noite. Por fim, são extremamente maleáveis, adaptam-se às culturas, às circunstâncias, às modas, aos momentos históricos. E, o que é mais importante, influenciam um número muito maior de pessoas.
Eles são o gérmen da humanidade futura, quando conseguirmos criar receptáculos eletrônicos capazes de registrar em si personalidades complexas, memórias totais, biografias inteiras. Temos hoje a ilusão de imaginar que os personagens literários são meras sombras ou reflexos das pessoas de verdade. O avanço da ciência nos mostra, para o bem ou para o mal, que sombras e reflexos somos nós. Que somos um mero estágio para a criação dos seres indestrutíveis do futuro, criaturas com muito maior complexidade mental do que a que nos dão nossos poucos bilhões de neurônios. Criaturas que serão feitas, como diz William Gibson, não de um iceberg, mas de uma Antártida de informação. Serão personagens, serão imortais, serão ubíquos, e nas suas memórias virtuais dedicarão alguns trilhões de terabytes para cultivar a memória dos bípedes mamíferos que os antecederam e que os inventaram.
Um garoto de cinco anos entende melhor o que é ficção do que qualquer marmanjo de cinqüenta. De fato, como você vai dizer que o sujeito não existe, se em dezembro as ruas e as lojas estão cheias dele?! É o mesmo que se dá com o príncipe Hamlet, da Dinamarca. Se pudéssemos reunir todos os indivíduos que já usaram seu nome, vestiram suas roupas e disseram suas falas, encheríamos vários Maracanãs. Alguém tem a coragem de dizer que Hamlet não existe? Existe mais do que eu ou você, caro leitor, que se desaparecermos amanhã a Humanidade nem toma conhecimento. Mas desapareça Papai Noel, e você vai sentir o abalo no PIB.
Papai Noel e Hamlet podem não ter uma existência individual como a minha e a sua, mas a existência que têm é de causar inveja a qualquer um de nós. Para começo de conversa, são imortais, porque quando um ator morre o personagem continua. Depois, são ubíquos, podem estar em várias partes do mundo na mesmíssima noite. Por fim, são extremamente maleáveis, adaptam-se às culturas, às circunstâncias, às modas, aos momentos históricos. E, o que é mais importante, influenciam um número muito maior de pessoas.
Eles são o gérmen da humanidade futura, quando conseguirmos criar receptáculos eletrônicos capazes de registrar em si personalidades complexas, memórias totais, biografias inteiras. Temos hoje a ilusão de imaginar que os personagens literários são meras sombras ou reflexos das pessoas de verdade. O avanço da ciência nos mostra, para o bem ou para o mal, que sombras e reflexos somos nós. Que somos um mero estágio para a criação dos seres indestrutíveis do futuro, criaturas com muito maior complexidade mental do que a que nos dão nossos poucos bilhões de neurônios. Criaturas que serão feitas, como diz William Gibson, não de um iceberg, mas de uma Antártida de informação. Serão personagens, serão imortais, serão ubíquos, e nas suas memórias virtuais dedicarão alguns trilhões de terabytes para cultivar a memória dos bípedes mamíferos que os antecederam e que os inventaram.
2 comentários:
Eu não existo
Mas essa bundinha ai em cima existe e quando olho algo assim fico cético que um dia o mundo irá acabar. Se é que estamos num palneta, que é que viu a olho nu a bolinha azul, eu não...
ai que bundinha
Prazer
As crianças sempre entendem mais quando o assunto é verossimilhança possível. Existe um livro chamado "As pessoas mais importantes do mundo... que nunca existiram" que retrata bem esta questão abordada no texto, bem ajustado, do escritor Braulio Tavares. Parabéns!
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