sábado, 30 de maio de 2009

1056) A oposição ideal (4.8.2006)



A vantagem da democracia é a existência de uma Oposição livre, sem censura, sem repressão policial, uma Oposição aparelhada para criticar, e sem bloqueios institucionais que a impeçam de investigar e denunciar trambiques, falcatruas, sanguessugas, propinodutos e mensalões. A desvantagem da Democracia é que de vez em quando, pelas idas-e-vindas da política, a Oposição chega ao poder, e a primeira coisa que faz é deixar no capacho de entrada do Palácio todo o seu discurso, todas as suas promessas e ameaças, todos os seus valores e princípios. A Oposição só existe do lado de fora dos Palácios. É como num conto de fadas: o Príncipe que vai matar o Ogre cruza o limiar da porta do castelo, chega no salão, se olha num espelho, e percebe que agora o Ogre é ele mesmo.

PMDB, PFL, PSDB, PT, PDT... Por mais que se multipliquem as siglas partidárias refletindo a divisão de Poder em nosso país (agora apareceu até um tal de PCC, que parece que manda mais do que os outros) a verdade é que vivemos num bi-partidarismo simbólico entre partidos do Governo e partidos da Oposição (com a ressalva de casos como o PMDB, que sempre dá um jeitinho de sobreviver com um pé lá e outro cá). Quando o PT estava na Oposição, abria fogo cerrado contra numerosas práticas do governo do PSDB. Depois de 2002, quando a situação se inverteu, inverteu-se também o discurso de ambos: os tucanos, agora do lado de fora do Palácio, denunciam tudo de errado que acontece ali, como já acontecia durante seu reinado. O PT, agora do lado de dentro, adota o mesmo discurso ufanista, auto-glorificatório e não-me-toques que era uma especialidade tucana. “E la nave va”.

Vejo muita gente dizer: “Ah, eles falam isso, mas têm o rabo preso, quando estavam no Poder faziam a mesma coisa, quando voltarem ao Poder vão fazer de novo o que criticam agora, não são melhores do que ninguém...” Política, colegas, não é simplesmente esse campeonatozinho entre dois grupos, para ver “quem chega lá primeiro”. Política é a escolha de quem vai administrar o Tesouro público, o dinheiro do Povo (o que já não é pouco); e é também a disputa para escolher quem vai representar o nosso conceito de nacionalidade, nossa auto-imagem como povo.

Quando elegemos alguém estamos passando um cheque em branco, estamos dando carta-branca, procuração com plenos poderes para alguém agir em nosso nome. Fazer oposição é tão sério quanto governar. Não importa se o Opositor tem rabo preso. A crítica ao Governo não tem que servir simplesmente para comparar suas qualidades com as qualidades da Oposição. A crítica deve ser feita em função de um ideal de ética e honestidade que esteja acima de todos: do governo, da oposição e de todos nós, acima até do próprio povo. Se até um presidiário (quanto mais um político suspeito) aponta corretamente um erro do Governo, pouco importa o que o presidiário fez, pois não é com ele que o Governo está sendo comparado, e sim com o que o Governo deveria e poderia ser.

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