("Imagedump")
No que me toca, coube a John Lennon popularizar em suas entrevistas este princípio, que já vi expresso de diferentes formas em diferentes contextos. “Think globally. Act locally.” À primeira vista parece mais uma daquelas inumeráveis palavras-de-ordem de que os anos 60 foram pródigos. Em nenhuma época foi tão fácil condensar verdades universais em meia linha de texto. Os anos 60 precisam ser estudados como, além de tudo que notoriamente foram, a Idade de Ouro do Slogan.
Verdade é que a citação de Lennon data de uma época posterior, os anos 70 em que o beatle atingiu o que, em termos de sua biografia, pode-se considerar a maturidade. Pensar globalmente, ou seja, tentar entender o movimento geral do mundo e do tempo, como um visionário plantado em cima de uma colina, é uma atitude típica daquela década, e não da década precedente, que foi uma espécie de carnaval eletrificado. Agir localmente, contudo, denota uma humildade que não era propriamente o tipo de mentalidade que os revolucionários dos anos 60 cobravam de si próprios. A ordem, naquele tempo, era “transformar o mundo.”
Agir localmente é mais sensato, mais concreto, e mais constrangedoramente óbvio. Querer transformar o mundo é como querer apagar um incêndio florestal sozinho. Mal você acabou de cuidar de um problema, dez outros desabrocharam além do seu alcance. Agir localmente pressupõe não apenas que você pode se dedicar em paz ao problema que está resolvendo, mas que para que isto tenha algum sentido é preciso haver algum tipo de ligação, conexão, troca de informação entre você e as dezenas, centenas ou milhares de outras pessoas ou grupos que estarão “agindo localmente” em outros locais.
Se alguma vantagem a época atual tem em relação à época de Lennon é a possibilidade de que pequenos grupos globalmente dispersos possam atuar localmente enquanto cada um se mantém permanentemente informado sobre o que os demais estão fazendo. No tempo de Lennon, isto só podia se dar através de telegramas ou de telefonemas internacionais. Hoje, virou lugar-comum a ação coordenada de pessoas que vivem em continentes diferentes mas estão em permanente contato. É possível até mesmo um sujeito nos EUA ouvir um concerto de uma banda cujo baterista está no Japão, o baixista na Índia, o guitarrista no Brasil, o tecladista na Itália e o vocalista no Canadá. Músicos e ouvintes se conectam e atuam em tempo real.
Qualquer revista ou programa de TV tece loas como as do parágrafo anterior à globalização tecnológica; precisamos tecer loas igualmente entusiásticas ao “agir localmente”. Cada indivíduo tem um raio de ação próprio. Temos às vezes a impressão de que as grandes mudanças só ocorrem nas grandes cidades dos grandes países. Não é bem assim. É como se alguém tivesse determinado: “Vamos transformar o mundo, e você, Fulano, se encarrega do bairro do Alto Branco”.
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