terça-feira, 13 de abril de 2010

1904) Sequestro virtual (16.4.2009)



(drangooble)

É um dos golpes mais banais dos bandidos cariocas; não sei se já está em prática na Paraíba. Ligam para a família de uma pessoa, em geral uma criança ou adolescente, e dizem que o garoto foi sequestrado, está em poder deles. A família tem que levar não-sei-quantos-mil reais num lugar assim-assim, agora, já, senão o menino morre. A verossimilhança do golpe é garantida quando o bandido diz: “Se a senhora não acredita que é seu filho, escuta só”. O fone é passado para alguém e ouve-se uma voz abafada, histérica, tartamudeando pedidos de socorro; e logo retorna o primeiro interlocutor: “Vem logo, madame, porque seu filhote tá sangrando muito”.

Qual o pai ou a mãe que não treme na base quando uma bigorna dessas lhe cai na cabeça? Eu me considero um homem de sorte, porque já recebi uma dúzia desses telefonemas, mas na primeira vez que aconteceu era cedo da noite, e enquanto a voz desesperada gritava no receptor “pai, pai, eles vão me matar!” eu estava vendo meu filho a poucos metros, lanchando na cozinha. Desliguei o telefone, depois puxei-o para fora do gancho e deixei ali a noite toda, como a polícia aconselha fazer. Não tendo resposta, os caras ligam para o próximo número da lista e vão tentar a sorte com outro infeliz.

Na segunda vez foi mais dramático. Meu filho estava no colégio, era meio-dia, não tinha chegado ainda. A ladainha era parecida, “pai, pelo amor de Deus, tão me batendo!”. Bati o telefone. Mas ele ainda estava na rua... quem me garantia coisa alguma? Foram dez minutos de suplício psicológico até que a chave girou na porta e surgiu a silhueta desengonçada, mochila às costas, cabelão, camisa “Clockwork Orange”, e aquele ar desligado de quem está sempre pensando noutra coisa e nem sequer estranha chegar em casa para o almoço e ver o pai ajoelhado no centro da sala, beijando o sinteco.

A polícia aconselha ter um código para identificar se é ou não o filho. Zuenir Ventura, no “Globo” sugere tratar os bandidos com ironia. O bandido diz: “Quero dez mil pra devolver seu filho!” E a gente responde: “Dez mil?! Se você me devolver esse pentelho, eu vou querer vinte mil, de indenização!!!”. Talvez funcione. Mas já surgiu uma variante. Falsos pesquisadores ficam rondando a sala de espera dos cinemas, de prancheta em punho. Abordam um adolescente, dizem que é uma pesquisa do Ibope (todo brasileiro acredita na existência do Ibope), pedem nome completo, telefone de casa, nome dos pais, etc. Quando o garoto ou a garota entra na sala de exibição e desliga o celular, eles ligam para casa, já com a ficha completa, sabendo a aparência, como estava vestido, etc., e dizem: “Olhe, madame, só não boto pra falar com a senhora porque meus colegas acabaram de levar ela pro quarto dos fundos”. Os pais ficam no mesmo dilema de Pascal quanto à existência de Deus. A possibilidade de perda, se acreditarmos e aquilo for mentira, é pequena; mas se não acreditarmos e for verdade, quem pode calcular?

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