Thomas Pynchon é um desses autores que a gente lê tanta resenha de livro, e comentário, e teorizações onde ele é transcrito e citado como exemplo, que é como se já tivesse lido um livro do cara. Eu li alguns contos e artigos, começos de vários romances e por inteiro somente The Crying of Lot 49 (“O Leilão do Lote 49”), de 1966. É um livro enganosamente fino que se destaca numa obra como a de TP, de livros robustos, que vistos a meio metro podem ser confundidos com “A Song of Ice and Fire”. Pynchon é um dos criadores de um hiperrealismo pop, energizado pela ciência, imprevisível pelo uso da fabulação. Sua influência na FC está por toda parte: Gibson, Sterling, DiFilippo, K. S. Robinson, Tim Powers – cada um tem algo de Pynchon, de sua maneira de escrever nas entrelinhas da História.
Lot 49 é um livro sobre uma teoria da conspiração que a
protagonista vai desvelando pouco a pouco, enquanto executa a tarefa de
inventariar os bens de um amigo morto. Ela descobre, para seu horror, que
existe um outro sistema postal funcionando dentro da América, um sistema que
ela descobre chamar-se W.A.S.T.E. e ser gerido por uma organização invisível
chamada Trystero. É uma imensa rede
postal subterrânea, clandestina, não-percebida pelas autoridades, e que também
lida com malotes, carteiros, entregadores, selos, carimbos, viagens. Uma verdadeira “deep web” inacessível,
girando a todo vapor seu próprio mecanismo.
Oedipa Maas, mal começa a manusear os papéis de seu
ex-namorado Pierce Inverarity, percebe sinais estranhos aqui, ali e em toda
parte. Não lembro se alguma daquela
correspondências vindas, digamos, pela ferrovia subterrânea, é citada no livro
de TP. Porque seria fantástico
descobrir que há séculos aquelas pessoas nada mais diziam umas às outras, mas
para que o maquinismo não caducasse enviavam-se cartas em branco. Para que a
hera da rede postal não murchasse. Há
séculos o sistema mantinha-se ocupado e competente à custa de uma atividade
humana sem mensagem humana sendo trocada.