Em algumas histórias de mistério, a grande questão é: Quem matou
o milionário? Em outras, a questão é menor, mais modesta e mais grave: Qual o
sentido da existência humana? Um grande
ponto de partida para um mistério é quando alguém tem sua vida virada de pernas
para o ar, e não consegue convencer ninguém da sua inocência. Um mistério do
tipo: “E se um dia algo me acontecesse, e todos os testemunhos em volta
dissessem que aquilo não tinha acontecido?” Essa situação básica pode inspirar
milhares de variantes. O turista que perde tudo num piscar de olhos em terra
perigosa e estranha, p. ex.
Uma variante dessa situação é A Mensagem Misteriosa, ou O
Cartão Misterioso. Uma pessoa recebe um cartão em língua desconhecida, e, sempre
que pergunta a alguém o que tem ali, tudo que consegue é provocar escândalo,
fúria, repulsa... ser vítima de preconceitos, fobias e perseguições... e
ninguém lhe explica o que há escrito ali.
Outra variante é O Álibi Fantasma. O Álibi Fantasma consiste
na história em que um indivíduo qualquer, para livrar-se de uma acusação,
precisa comprovar coisas banais: quem é, o que faz, o que fez, o que lhe
ocorreu de anormal. Parece simples... até o dia em que ele precisa de livrar da
acusação de um crime e descobre horrorizado que ninguém confirma seu álibi, por
variadas razões.
A Dama Fantasma (Phantom Lady, 1942), de William Irish,
é um romance onde Scott Henderson, após uma briga com a esposa, sai à noite com
uma desconhecida que encontra no bar, leva-a ao restaurante, depois a um show,
despede-se sem perguntar seu nome ou seu endereço ... E descobre que alguém
matou sua esposa durante a noite, e que seu álibi depende do testemunho dessa
mulher, que ele não sabe quem é nem como localizar.
Tudo é assim. A Dama Fantasma de William Irish (na verdade
um pseudônimo de Cornell Woolrich, o autor da história original de Janela
Indiscreta de Hitchcock ou A Sereia do Mississipi, de Truffaut) é uma história clássica de
“Ninguém Acredita Em Mim”. Toda a obra de Woolrich/Irish é cheia de armadilhas,
identidades suprimidas do dia para a noite, corridas contra o relógio... São
pesadelos kafkeanos numa Nova York do pós-guerra, com um senso de clima “noir”
inigualável. Seus argumentos parecem aquelas histórias de Philip K. Dick em que
o sujeito acorda de manhã e descobre que não existe.