Sábado passado, a luta UFC 148, em que o brasileiro Anderson
Silva derrotou o norte-americano Chael Sonnen no 2o. assalto, deu a
bilheteria mais alta na história desse esporte: 7 milhões de dólares de
ingressos, sem contar os lucros de patrocínio e de transmissões na TV aberta e
em pay-per-view. A publicidade foi incrementada pelas entrevistas e declarações
de Sonnen, que, derrotado na primeira luta, soltou o verbo contra o brasileiro
(e contra o Brasil). Nos dias antes da
luta, falava-se: “Não vai ser uma luta, vai ser um massacre”, ou então “Não vai
ser uma luta esportiva, vai ser uma briga entre dois caras que estão cheios de
ódio um pelo outro”.
Nem tanto. Sonnen
atacou mais no primeiro assalto e Anderson se defendeu com perfeição. No
segundo foi a vez do brasileiro ir para cima e nocautear o outro. Fez mais ou menos como seu time, o
Corinthians, fez nos dois tempos contra o Boca Juniors semana passada. No final, Anderson (que cultiva a imagem
“bom rapaz”) puxou para perto de si um Sonnen contrafeito (ele cultiva a imagem
“bad boy”), falando ao microfone que aquilo era apenas um esporte, que nada
tinham um contra o outro, etc.
Temos milhões de anos de luta gravados em nosso DNA, e
poucos séculos de esporte. O esporte é luta sublimada, esvaziada de raiva real,
transformada num ritual simbólico onde se confrontam as respectivas habilidades
(futebol, tênis, natação, basquete, tudo).
As lutas tipo box e luta-livre, no entanto, são esportes ainda
perigosamente próximos da selvageria primitiva. Deslizam com facilidade para o
terreno da raiva, do impulso matador, predador.
E o público oscila entre as duas experiências. Uns (eu, por
exemplo) querem o jogo, a luta violenta mas sem raiva, em que depois do fim os
lutadores se abraçam, o perdedor parabeniza o vencedor, que por sua vez o
elogia, e depois vão comer churrasco juntos. Mas existe uma parte do público a
quem esse fingimento incomoda. Eles
querem briga de verdade. Não querem
essa “hipocrisia” de dois caras quebrando a cara do outro e depois dizendo-se
amigos. Querem ter certeza de que está
acontecendo alguma coisa de verdade, de que aquela luta exprime um conflito
real entre minha raça e a sua, meu país e o seu.