Este ano estão sendo comemorados os 450 anos de nascimento de William Shakespeare (1564-1616) e é claro que pipocam artigos sobre ele o tempo inteiro.
Achei no saite do The Telegraph (aqui: https://tinyurl.com/yxvgspmu), um texto intitulado “Shakespeare, o Rei do Espaço Infinito”, em que Dan Falk
examina os conhecimentos astronômicos do Bardo e sugere que eram muito
avançados para sua época, que ainda defendia a visão ptolemaica (a Terra como
centro do universo). O poeta de Avon foi contemporâneo de Copérnico (cujo livro De Revolutionibus é de 1543) e de sua teoria do Sol como centro do sistema
solar, e há muitos doutorandos ingleses passando pente-fino nas peças em busca
de referências.
Clássico é um autor que disse tanta coisa que
parece ter dito dez vezes mais. Sempre há
pessoas dissecando seus textos em busca de idéias marxistas ou ecológicas, em
busca de segredos sexuais ou profecias apocalípticas. Em Hamlet o príncipe
diz que poderia se imaginar “o rei do espaço infinito”, e isso dá uma lente moderna
ao olhar que ele ergue para as estrelas.
Falk
menciona que o primeiro relato detalhado de um inglês sobre a teoria de
Copérnico foi de Thomas Digges (c.1546-1595), que morava a algumas centenas de
metros do dramaturgo. Seu filho Leonard Digges era admirador dele, e contribuiu
com um texto para o famoso First Folio, a primeira edição das peças
shakespearianas.
Falk lembra que Shakespeare era contemporâneo de Giordano
Bruno, John Dee, Francis Bacon, Montaigne e outros homens de ciência cuja obra
ele bem podia conhecer, mesmo indiretamente.
Ele
observa que Shakespeare tinha oito anos quando explodiu a Supernova de
Cassiopéia, de 1572, e que talvez fosse essa a estrela brilhando “a oeste do
polo” nas palavras da Hamlet. Em todo caso, essa supernova foi observada por
Tycho Brahe, o maior astrônomo da época, na Dinamarca (a supernova ainda hoje é
chamada “estrela de Tycho”).
Brahe morava pertinho do castelo de Elsinor (local da história de Hamlet). O
astrônomo norte-americano Peter Usher vê em Hamlet uma alegoria entre as duas
visões cosmológicas do universo, com a vitória final da teoria
copernicana. E observa que dois parentes
próximos de Tycho Brahe chamavam-se “Rosencrans” e “Guildensteren”, dois
personagens cruciais no desfecho da peça.
O Bardo dá um passo adiante de Camões,
que em Os Lusíadas (1572) já havia descrito com olhos mistos de poeta, crente
e cientista a “máquina do mundo”, ainda geocêntrica, um sistema de estrelas que,
como a cultura Renascentista que o produziu, era um edifício religioso que foi
implodido aos poucos pelo edifício científico que cresceu dentro dele.