O texto resultante, “Uma
Coisa Supostamente Divertida Que Eu Nunca Mais Vou Fazer”, é alternadamente
fantástico, engraçado, assustador, intrigante. Como sou um escritor
profissional e Wallace também o era, recorro ao senso ético da profissão para
supor que ele não inventou nada daquilo. Sua interpretação dos fatos é a mais
subjetiva e distorcida possível (ele mesmo o admite várias vezes), mas se os
fatos forem mesmo aqueles o mundo é um lugar muito fantástico. Comparado a ele,
Salvador Dali é um Mondrian.
As 125 páginas do ensaio são uma mistura do jornalismo gonzo
de Hunter Thompson e da nostalgia claustrofóbica de E La Nave Va.
Documenta a hipertrofia das glândulas
consumistas que Henry Miller já tinha diagnosticado em Pesadelo Refrigerado e a cafonice endinheirada de True Stories de David Byrne ou de Heaven de
Diane Keaton.
Tem a voltagem de algumas das reportagens de Bruce Sterling ou
William Gibson (só que com humor). E nos faz sentir o tempo inteiro a flutuação
escheriana entre um corredor na Ilha de Caras e uma escada num filme de David
Lynch. A terrível revelação de que o Sonho Americano é, e sempre foi, uma “bad
trip” gerada por um LSD com defeito de fábrica.
Curiosamente, é um olhar tipicamente masculino, embora não machista, pelo tom
do seu discurso, a empáfia das descrições técnicas, a auto-ironia peculiar, o
prazer infantil das sugestões escatológicas, a camaradagem rude com os
serviçais...
Um grande livro, mas não consigo imaginar uma mulher gostando
dele, pelo menos as mulheres para as quais se destina a chamada “literatura do
olhar feminino”. Se isso de fato existe, o olhar de Wallace é um olhar
masculino, mesmo que ele não dê muita importância aos aspectos de gênero. Ele
tem uma irreverência e uma fascinação de rapaz adolescente pelos aspectos
numéricos, verbais e técnicos do mundo que está descrevendo. E desenvolveu um
estilo que é ao mesmo tempo produto desse mundo e caricatura crítica dele.