Foi um dos maiores compositores cariocas dos anos 1960. Hoje seu nome só é conhecido dos cariocas porque foi dado à Sala Funarte Sidney Miller, um teatro por onde já passou muita coisa boa na MPB, pertinho da Cinelândia. Foi roteirista e produtor de shows, fêz trilhas sonoras para o cinema e o teatro, mas ainda é lembrado por um pequeno grupo de fãs pelas belas canções distribuídas nos três LPs que lançou em vida. A extraordinária fluência e simplicidade poética de seus versos fêz com que mais de um crítico o colocasse ao lado de Chico Buarque no grupo dos compositores que estavam renovando a arte da letra-de-música no Brasil.
Sua música mais conhecida é “O Circo”: “Vai vai vai, começar a brincadeira... Tem charanga tocando a noite inteira... Vem vem vem ver o circo de verdade... Tem tem tem brincadeira e qualidade.” Foi uma das muitas canções em que Miller explorou o universo temático das cantigas infantis, cujos refrões ele utilizava como tema a ser desenvolvido em música e versos. O resultado disto foram canções de notável beleza poética e delicadeza, como “Marré de Cy”, “Menina da Agulha”, “Passa passa gavião”. Além disto, Miller também explorou o universo do samba e do choro, com canções de bela melodia e letra impecavelmente cadenciada, como “Botequim no. 1”, “Chorinho do Retrato”, “Meu violão” e “Quem dera” (“Mas canta, que toda verdade do mundo / tem sempre um poeta no fundo / meu canto é maior que a razão”).
Duas canções, no entanto, são para mim duas obras-primas, daquelas de arrebentar parâmetros. Uma é a amarga balada urbana “Pois é, pra quê”, uma melodia enganosamente bela e nostálgica, acompanhada por um violão e um assobio, e revestida por versos como: “A fome, a doença, o esporte, a gincana / a praia compensa o trabalho, a semana / o chope, o cinema, o amor que atenua / o tiro no peito e o sangue na rua / a fome, a doença, nem sei mais por quê / que noite, que lua, meu bem... pra quê?” Esta mescla de paisagem urbana, violência, doçura, perplexidade existencial, era típica do Tropicalismo (“Panis et Circensis”, “Eles”, “Ele falava nisso todo dia”), um movimento a que Miller nunca pertenceu, mas ao qual respondeu com canções deste nível.
Outra canção notável é “A Estrada e o Violeiro”, um épico trovadoresco que ganhou o prêmio de Melhor Letra num dos festivais da TV-Record, defendida por Miller e Nara Leão: “— Sou violeiro caminhando só, por esta estrada caminhando só... – Sou uma estrada procurando só, levar o povo pra cidade só...” O diálogo entre a estrada e o cantador-de-viola que caminha mundo afora tem versos primorosos, e é uma das grandes obras da MPB dessa época onde o repentista nordestino foi usado como símbolo do poeta errante, livre, disponível (outros exemplos são “O Cantador” de Dori Caymmi e Nelson Motta, e “Ponteio” de Edu Lobo e Capinam). Ibérico, carioca, nordestino, Sidney Miller morreu moço, em 1980, e deixou uma obra ainda hoje jovem.