quinta-feira, 9 de fevereiro de 2012

2788) A criação inconsciente (9.2.2012)



(Jon Kuta, "Schizophrenia")

Em sua palestra na revista eletrônica Edge (http://bit.ly/vmEGf8), o biólogo Mark Pagel comentou: “Eu gostaria de sugerir que os nossos processos criativos estão bem próximos de ser uma coisa aleatória. Nossos cérebros podem estar funcionando num nível subconsciente, criando idéias o tempo todo, o tempo inteiro, sem parar, e outra parte da nossa mente subconsciente está testando essas idéias. E aquelas que acabam se infiltrando em nossa consciência podem ser as que aparentam estar bem formadas, mas isto é porque elas podem ter passado através de um filtro, juntamente com uma porção de outras idéias randômicas, antes de chegar ao nosso consciente”.

Já deve haver por aí um mapeamento desse processo. Acompanhamento elétrico da atividade cerebral, mas nada que nos faça dizer com segurança coisas como: “Neste momento, ele estava à procura de um advérbio para completar uma frase”, ou “Ele está visualizando a rua em que mora e tentando imaginar se o trânsito vai estar bom, quando voltar para casa à noite”. Ainda não chegamos a esse ponto, mas não chega a ser impossível.

A atividade criadora, no entanto, parece ser permanente nos andares do cérebro feitos da Matéria Escura do universo. Einstein, Poincaré, Galileu, Kékulé, Descartes e outros já tiveram revelações inesperadas, caiu-lhes do céu a resposta que buscavam longamente a um problema científico ou matemático. O sujeito maltrata o juízo durante semanas ou meses em busca de uma resposta, e nada dela aparecer. Aparece quando ele está subindo num trem ou dormindo. Por que? O trabalho inconsciente, a preparação febril de dezenas de respostas que são avaliadas por um processo intermediário, exigente, paciente, que só deixa passar até a consciência aquelas idéias que lhe parecem ter algum potencial.

Chamar esse processo de “inspiração artística” idealiza sua natureza e dá a entender que ao artista basta esperar pelo inconsciente. Ora, o processo é aleatório, mas passa por muitos filtros. O inconsciente é preguiçoso e desorganizado. Botá-lo pra trabalhar pra gente demanda um bocado de esforço, porque ele só quer trabalhar para si mesmo. Essas iluminações repentinas só acontecem a quem está virando noite, fazendo serão, quebrando a cabeça em busca de uma resposta. A resposta, que parece cair do céu, sobe à superfície no meio desse caldo borbulhante de combinações, associações de idéias, hipóteses meio absurdas, tudo isso comparado, descartado, resgatado, escolhido, trazido à consciência. “Inspiração” é o resultado de muito trabalho duro. Não é por ser inconsciente que é menos trabalhoso. O inconsciente funciona melhor sob pressão.