Dias atrás, o poeta Geraldinho Carneiro foi eleito para a Academia Brasileira de Letras, onde vai ocupar a cadeira que foi ocupada por, entre outros, Manuel Bandeira.
Geraldinho é um dos “26
Poetas Hoje” que Heloísa Buarque de Hollanda botou pra dialogar, lado a lado, num
antologia famosa. Meu exemplar, que tenho até hoje, foi comprado na “Livro 7”
do Recife em 1976, ano do lançamento. Anos depois, vim morar no Rio de Janeiro,
onde me tornei amigo de muitos daqueles poetas, que serão sempre um referencial
para minha escrita. Com alguns, como Chacal e Leila Míccolis, participei de
inúmeras atividades como recitais, publicações, debates, agitos.
Deveria haver um conto de
FC sobre uma Academia de Letras que tornasse possível o diálogo entre os
sucessivos ocupantes de uma cadeira. Queria ver (nem vou falar nos demais
sócios) uma conversa entre Bandeira e Geraldinho, que têm muitas coisas em
comum. Durante estes anos em que vivo no Rio, Geraldinho tornou-se um tradutor
de Shakespeare muito elogiado. Bandeira traduziu o Macbeth. Assunto certamente é o que não lhes faltaria.
Todo poeta brasileiro deve
muito a Manuel Bandeira, e os que porventura não gostem dele devem-lhe muito
mais, porque lhe devem desculpas.
Geraldinho, com quem já
fui confundido no tempo em que usei cabelo grande, é um poeta dessa turma (à
qual também pertenço) que passa da poesia para a tradução de poesia, daí para o
teatro, e daí para a letra de música popular, como quem cruza salas contíguas
num mesmo prédio. São veiculações específicas de um fazer muito semelhante. (A
maioria das pessoas que escrevem assim nem se dão o trabalho de teorizar a
respeito, de tão óbvio que isto lhes parece, mas a atitude é essa.)
Poetas que misturam essas
atividades sempre se mantêm próximos da coloquialidade, da fala oral, mesmo
quando sua dicção poética se faz mais elevada ou mais profunda.
E agora a antologia de
Heloísa tem (acho eu) seu segundo representante na ABL (o primeiro foi o poeta
e ensaísta Antonio Carlos Secchin).
Lembro que no tempo dos
fanzines poéticos publiquei uns fragmentos onde dizia assim, triunfalmente: “Pela prática aberta, pública, desassombrada,
dos vícios de linguagem! São vícios
porque somos minoria. No dia em que nossa bandeira tremular no Petit Trianon,
serão virtudes”.
As academias literárias
são uma espécie de clube onde qualquer um pode se candidatar a sócio, mas tem
que ser aprovado por uma maioria deles.
Em alguns casos, a
aprovação tem que ser unânime, senão o candidato não entra. Li uma vez no EQMM um
conto sobre um clube assim, no qual é cometido um crime perfeito: um dos sócios
dá “bola preta” a todo e qualquer novo candidato, para que os sócios falecidos
não tenham substituto e no final ele seja o único proprietário de tudo.
As academias literárias
seguem todas, pelo menos aqui no Brasil, um modelo muito semelhante. Bem que
podiam inventar algumas variações. Por exemplo:
A Academia Oculta
Todos os membros seriam
incógnitos, assinando-se com pseudônimos (como os charadistas e enigmistas de
antanho). Sigilo total. Tudo seria por escrito. Muitas vezes, amigos próximos
iriam conviver durante anos sem que um soubesse que o outro era seu colega
acadêmico. Quebras de sigilo seriam punidas com vilipêndio e opróbrio.
A Academia Relâmpago
Como nos cargos públicos,
o acadêmico teria direito a um mandato de quatro anos para desfrutar das
benesses e “delicatesses”. Cabou o mandato, rua.
A Academia Provisória
Um autor seria admitido na
academia quando sua obra fosse considerada (pelos seus pares) suficientemente
boa. E se começasse a publicar livros ruins, seria demitido.
A Academia Assistencial
O novel acadêmico, uma vez
empossado, se obrigaria a dar todos os meses uma oficina literária intensiva,
de uma semana, para jovens de comunidades carentes. Pro resto da vida, ad immortalitatem. Uma espécie de
contrapartida social.
A Academia Randômica
Os membros da Academia
seriam sorteados, pelo número do CPF, entre os moradores da cidade, e
receberiam uma polpuda bolsa-criação para que, desse dia em diante, pudessem se
dedicar à literatura.
A Academia Ligação-Cruzada
Os integrantes das Academias
de Letras teriam que frequentar obrigatoriamente uma academia de exercícios
físicos, e vice-versa.