quinta-feira, 13 de janeiro de 2011
2452) O Ultra-Google (13.1.2011)
Este novo fenômeno do mundo digital vem comprovar minha tese de que tudo no mundo se deve ao Acaso, e mesmo os outros fatores que parecem contrabalançá-lo – a Vontade, a Necessariedade, o Determinismo, o Livre Arbítrio, a Convergência Sócio-Estatística – não passam de bolsões isolados no corpo do Acaso, como minúsculas bolhas de ar aprisionadas na massa densa de um iceberg. Uma década atrás, o sonho e xanadu mental de todo brasileiro eram as seis dezenas cabalísticas da Mega-Sena. Hoje, são os oito algarismos do telefone do Ultra-Google. Um programa especial os altera sempre que alguém acerta, de modo que quem tiver essa chance pode fazer um pedido, por mais complexo que seja; depois, não adianta discar de novo, porque o número mudou. Suas chances voltam a ser as mesmas de todo mundo.
Muitos amigos meus devem ter discado esse número por engano e perdido a oportunidade apenas porque estranharam a resposta calma e polida do outro lado da linha: “Ultra-Google. Em que posso servi-lo?”. O primeiro que teve uma resposta à altura foi meu amigo Dedé, da carvoaria, que, respondeu em cima da bucha: “Rapaz, me traga aqui em casa duas dúzias de Skol bem geladinhas, um prato de moela, e uma mulher!” Riu e desligou. Meia hora depois, tocou-lhe à campainha uma moreninha no capricho, com a encomenda em dois isopores. E a conta, claro. Que ele pagou e não se arrependeu. Depois matutou como o Ultra-Google sabia seu endereço, e deduziu que era através da conta do celular com que ligou.
João Paulo, aquele baixinho que trabalha na Chesf, ligou um número aleatório e quando ouviu a resposta disse, pra testar: “Quero uma pizza grande metade calabresa e metade pepperoni, uma Coca dois litros, uma camiseta preta tendo impressa minha foto e meu telefone, o livro novo de Veríssimo e um celular TIM em meu nome”. Meia hora depois recebeu a encomenda, pagou em cheque, e só reclamou do preço da camiseta (50 reais).
Oito números! Parece quase nada, mas vivo tentando, tentando... Jodélzio, que mora aqui no andar de baixo, mangou de mim dizendo que isso era lenda-urbana da operadora para fazer as pessoas ligarem mais e pagarem mais. Fiquei meio dubitativo, mas aí me chegou um email entusiasmado de Germana, que é produtora executiva na Sempre-Vídeo. Ela ligou para um fornecedor (estavam fazendo um longa-metragem sobre Villa-Lobos) e o Ultra-Google atendeu. De mau humor, ela disse: “Preciso de um palacete mobiliado estilo 1930, um trem de ferro e duas orquestras sinfônicas”. Preciso falar mais? O filme já ganhou três prêmios.
Ultra-Google! Por que não pensei nisto antes, por que deixei os americanos mais uma vez passarem na minha frente na árdua maratona das invenções que mudam o mundo? Continuo aqui, celular em punho, polegar infatigável. Meu pedido está pronto e decorado na ponta da língua. É só uma coisa, uma coisinha só, uma coisica de nada, nada, nada-nadinha... Atenda, Ultra-Google, por favor!
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