Por volta de 2005, o cineasta Joshua Oppenheimer viajou para
a Indonésia pensando em documentar os crimes de guerra cometidos pelo regime
que, em 1965, tomou o poder e promoveu um verdadeiro genocídio em seus inimigos
políticos, principalmente comunistas e chineses. A certa altura, começou a
entrevistar os carrascos propriamente ditos e se espantou ao ver como eles não
apenas não negavam os massacres cometidos, mas se orgulhavam deles (“mostram
que somos ferozes, e isso amedronta nossos inimigos”) e faziam questão de
contá-los em detalhe.
Oppenheimer chamou o principal deles, Anwar Congo, um negro
de seus 70 anos, e lhe pediu que co-dirigisse o filme, recriando as cenas das
execuções. O que se segue é uma experiência–limite de cinema documentário.
Anwar convoca ex-colegas e amigos para fazer o papel de torturadores e de torturados;
mostra como matou mais de mil pessoas estrangulando-as com arame (“porque o
sangue sujava nossas calças”); e produz, para deleite próprio e louvor de sua
pessoa, números musicais de uma natureza espantosamente “kitsch”, uma mistura
entre o cinema “naïf” e os espetáculos indianos de Bollywood.
O filme The Act of Killing (lançado em 2012) nos propõe
uma situação quase surreal, porque o diretor adquire a confiança do
entrevistado e o leva a pagar um mico de proporções globais, bem como confessar
crimes que poderiam levá-lo ao Tribunal de Haia. Mas Anwar vê o filme na versão
pronta, mostra-a aos amigos e à família, e diz estar orgulhoso do que fez.
Outro torturador diz para a câmara que não tem medo das cortes internacionais:
“Quem define o que é crime de guerra são os vencedores, e nós vencemos”. Eles
se orgulham da impunidade, num regime baseado na corrupção, na intimidação em
troca de dinheiro, e na existência de milícias violentas que têm Anwar Congo
como um dos seus ídolos.