Quando é domingo de sol eu sempre tenho uma certa esperança de que ao se abrir a porta do quarto dela seja Alvinho, que sempre acorda de bom humor e geralmente me chama para jogar bola na praia durante uma hora, meia hora, enquanto Mamãe se levanta e faz todo aquele ritual dela, de tomar um café vagaroso sem registrar a presença de ninguém, folheando o jornal, lendo como se aquilo lhe custasse o maior esforço, dizendo: “Hã. Hum.” Alvinho é gente fina, mas até agora só veio nos sábados à noite.
Quando não é ele, é Dr. Rui. Esse é mais idoso, mais
devagarzão, sempre levanta com Mamãe, preparam tudo juntos, trocando
instruções, receitas, o tempo da torrada, o modo de tampar a frigideira para
deixar o ovo bem estrelado, coisa e tal. Parecem um casal casado. Ele sempre me
cumprimenta, lembra do meu nome, pergunta como estou indo nos estudos, eu
sempre digo a mesma coisa, nem lembro o que.
Nos últimos meses tem aparecido um tal de Antonino, que eu
não gosto muito. Eu estudo à tarde e nem vejo mamãe sair pro trabalho, mas às
vezes levanto e ele está na sala, todo instalado, ouvindo música, mexendo nas
revistas, comendo, bebendo, como se estivesse na casa dele. E quando
conversamos os três, em geral durante o almoço, ele fica dizendo umas coisas
sem a menor graça e batendo com o cotovelo em mim, como se dissesse: “Bora,
rapaz, dá uma risada, afinal nós somos ou não somos dois malandrões? Ra ra ra.”
Pra ser desse jeito eu prefiro que seja como Seu Elias, que
é tímido que dá pena, fica meio longe de mim com uma expressão de culpa, nunca
me deu um bom dia, nunca me olhou nos olhos, e os únicos contatos que a gente
mantém são quando estamos na mesa e um estende a mão e o outro se apressa e
coloca ao alcance aquilo que está sendo procurado: o açúcar, a bolacha, o
leite; e esses pequenos gestos quase secretos acabam sendo uma espécie de
fumar-o-cachimbo-da-paz.
Teve
o caso de Dorival, que passou semanas vindo e deixou para sempre de vir depois
que Mamãe o flagrou tentando me fazer botar um cigarro na boca.
Teve o problema
com aquele malucão que cismou que eu tinha tirado um dinheiro da carteira dele,
Mamãe teve que fazer um verdadeiro histórico do que eles tinham gasto durante a
noite, táxi, conta num bar, no outro, cigarro, dogão na calçada, táxi de novo,
ele acabou me pedindo desculpas, mas nunca mais apareceu.
Ou aquele louro de
óculos, nem lembro o nome, que falou uma vez: “E esse moleque, precisa ficar
aqui, vigiando a gente? Vai lá pra fora, vai, seu merdinha.” Mamãe soltou da boca o canudinho do
refrigerante e disse: “Pra fora vai você.
Filho da puta.”