(A Noiva de Frankenstein, 1935)
As receitas de cada um de nós se compõem em função do
repertório do que lemos, do que ouvimos, do que assistimos, e cada combinação
pessoal é única.
Na minha lista, uma narrativa Gótica moderna (romance, conto,
cinema, HQ, etc.) tem que ter sempre uma presença muito forte do espaço, porque
o próprio nome nos traz à mente a arquitetura. O espaço do romance ou do conto
gótico, portanto, sente-se à vontade em paisagens com vastos espaços vazios no
meio dos quais se ergue uma construção colossal (“A Casa de Usher”). Uma
topografia medieval, que encontra seu contraponto na cidade: um vasto espaço
fervilhante de seres e recortado em espaços que parecem poder se subdividir e
se multiplicar indefinidamente (Metrópolis).
Também das catedrais vem o lado sobrenaturalista tão
essencial do gótico: fantasmas, rituais, maldições. A existência de um mundo
superior ao nosso, do qual somos sombra e reflexo, “as above, so below” está
presente na narrativa gótica, mesmo a de cunho mais sadista e blasfemo. O
gótico pode não acreditar em Deus, mas isso não o impede de negociar a alma com
o Diabo.
João Cabral de Melo Neto revelou a medula gótica da nossa civilização
dos engenhos quando disse, mais ou menos: “Meu problema com religião é que não
acredito em Deus mas morro de medo do inferno.”
O gótico envolve paixões extremadas e violência física.
Etimologicamente, invoca os Godos do original, bárbaros, cruéis, cujos genes
talvez estejam espalhados pelo Brasil. Os visigodos viveram na Península
Ibérica e foram parte essencial do levante que expulsou de volta os Mouros.
O
romance gótico só termina deixando pelo caminho algumas tragédias. E, retomando o viés sobrenatural citado
acima, pode-se dizer que a visão-do-mundo gótica implica na revelação da
existência do Mal no mundo.
Já usei o termo “Ciência Gótica” para descrever ambientes
como o “laboratório de Frankenstein” ou o “sótão do alquimista” ou os “centros
secretos de pesquisa da Nasa / CIA / FBI / KGB / etc”. É um arremedo de cenário
científico, mas as mentes que o manipulam são insanas, ou malévolas, ou
simplesmente bizarras. A Ciência Gótica é uma ciência sequestrada por objetivos
e métodos com os quais o espírito científico não tem muita afinidade.
O Gótico narrativo envolve a noção de um Universo
parcialmente oculto e indevassável, de onde brotam comandos absurdos,
inexplicáveis, determinando nossa fortuna ou desgraça; e a tentativa de criação
de processos artificiais para controlar esses poderes ou negociar com eles, em
situações sempre de vida ou morte. Situações-limite onde o triunfo, a
felicidade e o conhecimento jamais ocorrem juntos.