(Bela Lugosi, 1931)
Um vampiro nunca pode entrar por vontade própria quando vai
pela primeira vez à casa de alguém. Ele precisa ser convidado a entrar por
alguém, pertencente à residência (ver Drácula, cap. 18). Depois que alguém
diz: “Oh, Conde Drácula, mas que surpresa, veio conhecer minha humilde casa,
pode entrar, não repare a bagunça”, ele entra, e a partir desse instante você
perdeu todo seu domínio, todo seu direito à proibição, à interdição da
presença. Ele poderá entrar e sair à vontade.
Esta é uma das regras da existência do “nosferatu”, mas ela
se estende a outros domínios. Celia Fremlin, escritora inglesa, tem um conto
arrepiante sobre uma menina que está
sozinha em casa numa noite chuvosa, na ausência dos pais, e ouve outra menina
batendo à porta, pedindo para entrar. (Vejo um eco desse conto, que é bem
antigo, no filme sueco, depois refilmado nos EUA, Deixe ela entrar) É um dos medos mais primitivos da humanidade.
Se você está trancado e em segurança num ambiente familiar, confortável, etc.,
será que se arriscaria a deixar entrar ali um desconhecido, que pode
representar uma ameaça? (Lembrem de Laranja Mecânica: “Por favor... sofremos
um acidente na estrada... meu amigo está ferido... deixem-nos usar o
telefone...”).
A paranóia da hospitalidade é uma daquelas situações
analisadas na Teoria dos Jogos em que você é forçado a uma decisão porque com a
decisão oposta teria pouco a ganhar (se desse certo) e muito a perder se desse
errado. Na dúvida, é melhor dizer: “Vá embora, não vou abrir pra ninguém, vá
bater noutra porta”.
Deixar entrar um estranho: eis uma fórmula simples para
muitas situações trágicas. Curiosidade e ingenuidade são uma combinação perigosa,
vide os troianos ao receber o presente do cavalo de madeira. Levaram o Estranho
para dentro de suas muralhas, que era justamente onde ele queria chegar. Não foram muito mais espertos do que os
índios brasileiros que aceitaram roupas usadas e morreram de peste.